quinta-feira, 12 de julho de 2012

Controle de Constitucionalidade - Considerações Iniciais

Constituição e constitucionalidade são conceitos indesligáveis e o controle de constitucionalidade, técnica de limitação do poder através da submissão dos podres constituídos, visa garantir, por vários mecanismos, a supremacia material e formal da Constituição sobre as leis e os atos do governo e da Administração.
A Constituição é garantia, mas que, a seu turno, tem de ser garantida, o que se dá pela efetivação do princípio da constitucionalidade. Sendo a Constituição norma jurídica, sua garantia deve ser prevista por norma jurídica. O controle de constitucionalidade, nesse horizonte, passa a ser tido como autônomo em relação à Constituição, título de segurança e justiça.

Controlar a constitucionalidade é verificar a adequação de uma lei ou de um ato normativo com a Constituição, nos seus aspectos formais e materiais; o controle de constitucionalidade é um juízo de adequação da norma infraconstitucional (objeto) à norma constitucional (parâmetro), por meio da verticalização da relação imediata de conformidade vertical entre aquela e esta, com o fim de impor sanção de invalidade à norma que seja revestida de incompatibilidade material ou formal com a Constituição.

O controle de constitucionalidade alcança também a garantia dos direitos fundamentais constitucionalmente protegidos os quais, além de legitimar o Estado, viabilizam o processo democrático preservando o Estado de Direito.

Compreende-se que a idéia da rigidez revela a chamada supremacia ou superlegalidade constitucional, devendo todo o ordenamento jurídico conformar-se com os preceitos da Constituição, quer sob o ponto de vista formal (competência para a edição do ato normativo e observância do processo legislativo previsto para a elaboração da norma jurídica), quer sob o ponto de vista material (adequação do conteúdo da norma aos princípios e regras constitucionais).

O controle de constitucionalidade das leis, como garantia da Constituição, está, pois, intimamente relacionado com a concepção de Constituição rígida, embora a idéia de supremacia a Constituição seja inerente também à de Constituição flexível, mas, nesse caso, trata-se de superioridade material, já que a superioridade formal é revelada pelo caráter rígido das Constituições.

Manoel Gonçalves Ferreira Filho ensina que o critério real de distinção entre rigidez e flexibilidade constitucionais, bem como entre Poder Constituinte originário é Poder Constituinte derivado, implica a existência de um controle de constitucionalidade, pois em todo Estado onde faltar tal medida, a Constituição é flexível; por mais que a Constituição se queira rígida, o Poder Constituinte perdura ilimitado em mãos do legislador. Este, na verdade, poderá modificar, a seu talante, as regras constitucionais, se não houver órgão destinado a resguardar a superioridade desta sobre as ordinárias. Mas ainda, órgão bastante para fazê-lo.

Exemplo de país de Constituição flexível é a Inglaterra, onde supremo é o Parlamento. E essa supremacia é caracterizada pelos seguintes elementos: a) poder do legislador de modificar livremente qualquer lei, fundamental ou não; b) ausência de distinção jurídica entre leis constitucionais e ordinárias; c) inexistência de autoridade judiciária ou qualquer outra com o poder de anular um ato do Parlamento ou considerá-lo nulo ou inconstitucional.

Jorge Miranda, em contraponto, depois de mostrar que, seja qual for o seu tipo, a Constituição, rígida ou flexível, pode ser atacada por normas e atos material e formalmente viciados, pelo que a inconstitucionalidade existe, quer em Constituição rígida, quer em Constituição flexível, esclarece: “Na verdade, o critério desta distinção – para o seu grande autor James Bryce, a distinção principal a fazer entre todas as Constituições – está na posição ocupada pela Constituição perante as chamadas leis ordinárias. Se ela se coloca acima destas, num plano hierárquico superior, e encerra características próprias, considera-se rígida; ao invés, se se encontra ao nível das restantes leis, sem um poder ou uma forma que a suportem em especial, é flexível. Apenas as Constituições rígidas, e não também as Constituições flexíveis, são limitativas, porque ultrapassam as leis e prevalecem sobre as suas estatuições”.

Por isso é que a distinção entre Constituições rígidas e flexíveis não se põe no contexto da teoria da inconstitucionalidade, mas no da teoria da revisão constitucional, como qualificação de dois processos próprios, o que leva à compreensão de que a garantia da Constituição tenha nascido naqueles países em que é rígida.

A idéia de supremacia da Constituição leva também ao reconhecimento de uma superlegalidade material, que assegura uma preeminência hierárquica sobre todas as demais normas do ordenamento, obra do poder constituinte.

A aderência da rigidez ao conceito de Constituição formal acentua e robustece a distinção entre lei ordinária e lei constitucional, mediante disposição hierárquica, sob a égide suprema da Lei Magna. Para manter inalterável essa hierarquia, a Constituição rígida e formal reclama, doutrinária e praticamente, instrumento eficaz que a defenda. Não basta o simples reconhecimento teórico da supremacia constitucional.

O controle de constitucionalidade das leis e dos atos normativos pressupõe a satisfação de alguns pressupostos: i) existência de uma Constituição formal; ii) compreensão da Constituição como lei fundamental (rigidez e supremacia constitucionais), distinção entre leis ordinárias e leis constitucionais; iii) previsão de pelo menos um órgão dotado de competência para o exercício dessa atividade de fiscalização.

Pode-se dizer, em síntese, que da supremacia da Constituição decorrem os seguintes princípios, que se têm como referentes ao controle de constitucionalidade: a) princípio da unidade, em que as normas inferiores devem-se adequar às normas superiores da Constituição; b) o princípio da constitucionalidade, isto é, de verificação da compatibilidade das normas infraconstitucionais com as normas superiores; c) o princípio da razoabilidade, segundo o qual as normas infraconstitucionais devem ser instrumentos ou meios adequados (razoáveis), aos fins estabelecidos na Constituição; d) princípio da rigidez para reforma da Constituição, que não pode ser feita pelo mesmo procedimento de elaboração da norma legislativa comum; e) distinção entre poder constituinte e poder constituído, que é a atribuição da competência funcional a determinar quem pode criar os diversos níveis jurídicos; f) graduação do ordenamento jurídico em diversos níveis, desde a norma fundamental abstrata até o ato de execução pelo órgão público; g) garantia do Estado de Direito, pois os órgãos públicos se encontram limitados por determinações do poder constituinte.

Designando conceito de relação, entende-se por inconstitucionalidade a desconformidade de um ato normativo do poder político referentemente à Constituição. A inconstitucionalidade é um corolário do princípio da hierarquia das normas jurídicas e também da necessidade de garantia da própria Constituição.

Não só o legislador comete ofensas à Constituição, já que a relação de inconstitucionalidade pode também derivar do comportamento de vários agentes e ser praticada por diversos modos, como o ato do administrador público que deixa de observar determinações e princípios gerais da Administração, ou não atende aos direitos públicos subjetivos previstos no texto constitucional, bem como o ato do Juiz que desrespeite, no processo, as garantias e prerrogativas dos litigantes.

A inconstitucionalidade reside no antagonismo e contrariedade do ato normativo inferior (legislativo ou administrativo) com os vetores da Constituição, estabelecidos em suas regras e princípios.

O vício que afeta o ato inconstitucional traduz defeito de sua formação, ou desrespeito da competência constitucional prevista para a sua prática. A inconstitucionalidade formal abrange, portanto, a inconstitucionalidade orgânica e a inconstitucionalidade formal propriamente dita.

A inconstitucionalidade orgânica decorre da inobservância da regra de competência para a edição do ato, ou do vício de competência do órgão que promana o ato normativo.

A inconstitucionalidade formal propriamente dita decorre da inobservância do procedimento legislativo fixado na Constituição.

No âmbito do processo legislativo, o vício formal de inconstitucionalidade é também conhecido como vício subjetivo se ocorrer na fase de iniciativa, e como vício objetivo se ocorrer nas demais fases do processo legislativo.

Tem-se então que o controle de constitucionalidade, no processo legislativo, envolve apenas aspectos formais de constitucionalidade das leis em gestação, e examina a regularidade ou não de cada ato autonomamente isolado, que se compõe no processo legislativo, na maioria das vezes qualificado como ato interno das Casas Legislativas.

A inconstitucionalidade formal, portanto, caracteriza-se como vício do ato e não das normas constantes do ato. Pode interferir no equilíbrio entre poderes, ao violar a reserva de lei ou de regimento. Em rigor, afeta todo o texto normativo na sua integralidade, pois o ato é considerado formalmente como uma unidade.

A inconstitucionalidade orgânica e a formal podem ser total ou parcial.

Cuida-se de inconstitucionalidade material aquela em que o conteúdo do ato se acha em desacordo com o conteúdo da Constituição. Uma espécie consiste na inconstitucionalidade por excesso de Poder Legislativo, traduzida na incompatibilidade da lei com os fins constitucionalmente previstos, ou na inobservância do princípio da proporcionalidade.

Ao órgão responsável pelo controle de constitucionalidade cabe, nos limites da verificação do excesso de poder legislativo, ou desvio de finalidade, sindicar acerca da inserção ou não da norma nos critérios constitucionais, a correspondência ou não de fins, a harmonização e a desarmonização de valores, a violação de princípios constitucionais, como o da igualdade e proporcionalidade, a violação de normas programáticas, o uso das autorizações constitucionais de restrição e de suspensão de direitos, liberdades e garantias, pelo Parlamento, da obrigação de definir bases gerais, regimes gerais ou enquadramento de certas matérias, ou a obrigação de definir o sentido de autorizações legislativas.

Nada obstante, o apontado excesso da função jurisdicional é contrabalançado pela idéia de que a jurisdição constitucional, como poder contramajoritário, é protetora das minorias e dos direitos fundamentais, contra os excessos da maioria parlamentar, observando-se, ademais, que o órgãos judicial controlador da constitucionalidade não expressa a sua vontade, mas a vontade do próprio povo.

A inconstitucionalidade por ação pressupõe uma conduta positiva do legislador, que se não compatibiliza com os princípios constitucionalmente consagrados. Acarreta a invalidação de um ato que existe, que foi praticado.

A inconstitucionalidade por omissão decorre da inércia ou do silêncio do legislador, descumprindo a obrigação constitucional de legislar. Trata-se de uma inércia (non facere) ilegítima do Estado. Resultará de um comportamento incompatível com a obrigação jurídica de conteúdo positivo. A omissão constitucional pode ser total ou parcial.

A inconstitucionalidade originária decorre de um ato violador da Constituição, na vigência da norma constitucional.

A inconstitucionalidade superveniente ocorre quando nova norma constitucional surge e dispõe em contrário de uma lei ou de outro ato precedente. Para a maioria dos autores, não se trata de inconstitucionalidade, mas de derrogação do direito anterior, incompatível com a norma constitucional posterior, devendo, pois, a questão ser resolvida no âmbito do direito intertemporal. Desse modo, a ação direta de inconstitucionalidade não deve sequer ser conhecida, por se revelar incabível quando se trata de declaração de inconstitucionalidade de lei anterior à Constituição e nesse sentido já decidiu o Supremo Tribunal Federal.

A inconstitucionalidade superveniente não é admitida no controle concentrado, mas no difuso tem sido reconhecida a possibilidade de sua argüição. Tratando-se de inconstitucionalidade material, possível que se reconheça a incompatibilidade do conteúdo da norma criada sob a vigência da Constituição anterior com a nova Constituição.

De remarcar que, em se tratando de inconstitucionalidade superveniente formal, tem-se, no controle difuso, como válida a norma que fora produzida em conformidade com o processo legislativo vigente à época de sua elaboração.

A inconstitucionalidade pretérita afeta as normas criadas sob a vigência de uma Constituição que deu lugar a outra, mas que se configura pelo fato de as normas infraconstitucionais serem incompatíveis com a Constituição não mais existente, e não com a atual.

No âmbito do controle concentrado, tem-se como incabível ação direta com o objetivo de obter a declaração de inconstitucionalidade de lei em abstrato em face de Constituição já revogada ao tempo da propositura da ação. Com efeito, ao Supremo Tribunal Federal cabe a guarda da Constituição atual, e não de toda e qualquer Constituição.

A Corte Suprema decidiu que, em se tratando de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, a discussão sobre a legitimidade de lei pré-constitucional em face de ordem constitucional superveniente pode ser precedida de indagação sobre a constitucionalidade da lei em face da ordem constitucional anterior – embora não declarada a inconstitucionalidade.

A inconstitucionalidade pretérita tem sido, entretanto, admitida no âmbito do controle difuso-incidental, retroagindo os feitos para nulificar os atos praticados em violação à anterior Constituição. As questões a serem resolvidas, no controle difuso, pertinentes à inconstitucionalidade preteria, envolvem o direito intertemporal, devendo-se observar a data do julgamento.

A inconstitucionalidade progressiva (lei ainda constitucional) ocorre nos casos em que a lei, que nasceu constitucional, vai transitando para a esfera da inconstitucionalidade, até tornar-se írrita. A implementação de uma nova ordem constitucional não é um fato instantâneo, mas um processo em que a possibilidade de realização da norma da Constituição subordina-se muitas vezes a alterações da realidade fática que a viabiliza.

A inconstitucionalidade total verifica-se na hipótese de abrangência de todo o ato normativo, o vício o contamina em toda a sua inteireza.

A inconstitucionalidade parcial alcança apenas parte do ato normativo, por exemplo, um ou vários dispositivos, ou fração deles, como expressões ou palavras. Diferentemente do veto parcial, a inconstitucionalidade parcial, em virtude do caráter de parcelidade da norma, não se limita a texto integral de artigo, parágrafo, inciso ou alínea.

A inconstitucionalidade antecedente ou imediata decorre de um juízo de violação direta e imediata, de norma constitucional, por um lei ou ato normativo inferior.

Por outro lado, a inconstitucionalidade conseqüente/derivada/por arrastamento decorre de um efeito reflexo da inconstitucionalidade antecedente ou imediata. Será, desse modo, inconstitucional a norma dependente de outra declarada inconstitucional, ou seja, se uma lei é inconstitucional, o decreto que a regulamentou também o será, já que com aquela mantém relação de dependência.

A inconstitucionalidade causal ocorre quando o ato praticado não atende à situação fática que a Constituição instituiu como pressuposto de sua existência.

Se a inadequação entre a norma ou ato normativo do Poder Público se der frente aos postulados da Constituição, trata-se de inconstitucionalidade, mas se esta inadequação referir-se à lei, o ato será ilegal.

Em princípio, a inconstitucionalidade refere-se a comportamentos do Poder Público, e não a atos dos particulares, ainda que de caráter normativo.

O Estado é responsável pelos atos que pratica. Também é responsável pela ordem jurídica, e, sendo a inconstitucionalidade um vício da norma, cabível a indenização pelos danos dela decorrentes. O ato inconstitucional pode, então, gerar a responsabilidade civil do Estado e, também, a pretensão indenizatória. Para tanto, é imprescindível que se verifique o nexo causal entre a lei inconstitucional e o dano ocorrido.

Kelsen, ao sustentar a necessidade de um controle concentrado de constitucionalidade, a cargo de um Tribunal Constitucional, reafirma que a defesa da Constituição visa justamente evitar sua violação. Só a justiça constitucional, porque associada ao regime democrático, é capaz de oferecer garantias eficazes contra o risco de esmagamento das minorias e da violação dos direitos fundamentais. Ainda para Kelsen, o Tribunal Constitucional não exerce pura função jurisdicional, mas legislativa negativa, com a invalidação das leis, pelo que partilha da função legislativa.

Jürgen Habermas, que se opõe ao positivismo e adota concepções filosóficas iluministas, com raízes em Kant, após dizer que a concretização do direito constitucional através de um controle judicial de constitucionalidade serve, em última instância, para a clareza do direito e para a manutenção de uma ordem jurídica coerente, concebe a justiça constitucional como necessária à defesa dos direitos fundamentais contra as maiorias legislativas. Em sua teoria procedimentalista da democracia, Habermas observa que o Tribunal constitucional deve proteger o sistema de direitos que possibilita a autonomia privada e pública dos cidadãos. Por isso, o Tribunal constitucional precisa examinar os conteúdos de normas controvertidas especialmente no contexto dos pressupostos comunicativos e condições procedimentais do processo de legislação democrático. Tal compreensão precedimentalista da Constituição imprime uma virada técnico-democrática ao problema da legitimidade do controle jurisdicional da Constituição.

O pensamento de Dworkin, quanto à conciliação de uma jurisdição constitucional com a democracia, é nítido: a partir da distinção entre democracia majoritária, fundada no princípio da maioria, e de democracia constitucional, aduz que a justiça constitucional deve tomar decisões de princípio e não de política, é dizer, decisões acerca dos direitos das pessoas e não sobre como promover melhor o bem-estar geral. A democracia verdadeira é aquela em que todas as pessoas são tratadas com igual respeito e consideração. A jurisdição constitucional é a que assegura que as questões mais importantes de moralidade pública serão finalmente expostas e debatidas como questões de princípio e não de poder político.

A justiça constitucional, a cargo dos Tribunais Constitucionais, afirma-se como uma condição de possibilidade do próprio Estado Democrático de Direito, que tem como pilares o regime democrático e a garantia dos direitos fundamentais. A soberania do Parlamento é substituída pela soberania e supremacia da Constituição.

A previsão de um Tribunal Constitucional como defensor da Constituição é hoje uma exigência democrática. A necessidade de uma justiça constitucional, a cargo dos Tribunais Constitucionais, corresponde ao declínio de uma idéia de lei, a partir da constatação de que também o legislador comete erros e abusos (o legislador expressa a vontade popular livremente, mas ele próprio não é soberano, pois soberano é poder político estatal) que devem ser corrigidos por um órgão autônomo em relação a ele, e que não esteja comprometido com as opções políticas dos legisladores. Há, portanto, limites constitucionais à atividade legiferante.

O controle de constitucionalidade é a garantia institucionalizada da Constituição, um sistema, um processo criado a título mais ou menos específico para tal fim. A garantia é um fim mais que um meio, o controle um meio e nunca um fim em si mesmo; a garantia é um resultado hipotético ou que se almeja, o controle consiste, sobretudo, numa atividade.

Quanto ao parâmetro, o controle de constitucionalidade pode referir-se a: a) toda a Constituição formal, nela incluídos os princípios e regras implícitos; b) apenas alguns dispositivos da Constituição; c) um bloco formado pela Constituição formal e ainda os princípios superiores definidos como direito supralegal, tais como os princípios implícitos positivados ou não na Constituição. A regra geral tem sido a do parâmetro de toda a Constituição formal.

Considerando o órgão encarregado de exercer o controle de constitucionalidade, pode ser ele: a) político; b) jurisdicional; c) misto.

O sistema político, originário dos países da Europa, notadamente a França, é aquele em que a constitucionalidade é verificada por um órgão político, distinto do Judiciário, ou pelo próprio Legislativo ou pelo Chefe de Estado, ou ainda por um órgão especial.

O sistema jurisdicional consiste no controle da constitucionalidade efetivado pelo Poder Judiciário. Esse sistema tem sua origem nos Estados Unidos. A evolução do sistema jurisdicional de controle de constitucionalidade acabou por conhecer, além o difuso, em que cabe a todo e qualquer Juiz ou Tribunal, o concentrado, que é exercido por um único órgão do Poder Judiciário, normalmente seu órgão de cúpula, ou por um Tribunal criado exclusivamente para esse fim.

Considera-se o Poder Judiciário competente para o exercício do controle de constitucionalidade, quando não há na Constituição previsão para a sua efetivação, como ocorreu nos Estados Unidos, salientando ser inerente a esse Poder a competência para a aplicação do direito, o que implica naquela de desaplicar as normas jurídicas, quando contrárias à Constituição.

O controle jurisdicional tem por si a naturalidade, pois a verificação da constitucionalidade de uma norma não é senão um caso particular de verificação de legalidade, atribuição que frequentemente é desempenhada pelo Poder Judiciário.

O sistema misto é que o controle de constitucionalidade é entregue a um órgão especial constituído por membros do Poder Judiciário e outros estranhos a esse Poder. Sendo atividade legislativa, a decisão do Tribunal Constitucional tem eficácia erga omnes, sendo ainda constitutiva e não declaratória como no sistema norte-americano. Tem-se ainda, como misto o sistema em que algumas leis são submetidas ao controle do Poder Judiciário, outras ao controle político, como na Suíça.

O controle preventivo se efetiva antes da lei promulgada e é praticado especialmente na França, onde cabe ao Conselho Constitucional. O controle preventivo é mais abrangente, por alcançar a adequação das leis em vias de promulgação aos preceitos constitucionais, quer sob o ponto de vista material, quer sob o ponto de vista formal. No controle preventivo, a Constituição, portanto, define o órgão competente para apreciar a constitucionalidade da lei preventivamente, indica os titulares da iniciativa para deflagrar o processo de controle, estabelece os prazos da ação e delimita seus efeitos.

O controle repressivo, ou sucessivo, incide sobre a lei promulgada e outros atos normativos do Poder Público. No Brasil é exercido pelo Poder Judiciário, podendo ser difuso ou concentrado. Difuso é aquele exercido por uma pluralidade de órgãos, como nos Estados Unidos, e concentrado quando reservado a um ou a poucos órgãos, como se verifica na Alemanha e demais países da Europa continental.

No Brasil, a despeito de o controle repressivo ser sobretudo jurisdicional, a Constituição prevê em seu artigo 49 inciso V que esse controle pode ser também político – exercido pelo Congresso Nacional – ao atribuir-lhe a competência para sustar os efeitos dos atos normativos do Poder Executivo, que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites da delegação legislativa, o que se efetiva mediante decreto legislativo promulgado pela Mesa do Congresso Nacional. Outra hipótese de exercício do controle repressivo de constitucionalidade, pelo Congresso Nacional, se dá quando rejeita medida provisória inconstitucional.

Prevalece a tese da possibilidade de o Executivo descumprir lei que considere inconstitucional. O entendimento doutrinário aponta a supremacia da Constituição como fato que não pode ser desconhecido para legitimar o não cumprimento de lei inconstitucional. Além disso, há um reforço ao argumento dado por Luís Roberto Barroso: “é que até mesmo o particular pode recusar o cumprimento à lei que considere inconstitucional, sujeitando-se a defender sua convicção caso venha a ser demandado. Com mais razão haverá poder fazê-lo o Chefe de um Poder”. Considera-se também que a extensão da propositura de ação direta de inconstitucionalidade ao Chefe do Poder Executivo Federal e Estaduais não constituiria óbice a que deixassem de recusar cumprimento a leis inconstitucionais.

Depois da promulgação da Constituição de 1988, o Supremo Tribunal Federal tende a manter o entendimento segundo o qual o controle de constitucionalidade da lei ou dos atos normativos é da competência exclusiva do Poder Judiciário. Os Poderes Executivo e Legislativo, por sua Chefia – e isso mesmo tem sido questionado com o alargamento da legitimação ativa na ação direta de inconstitucionalidade – podem, tão-só, determinar aos seus órgãos subordinados que deixem de aplicar administrativamente as leis ou atos com força de lei que considerem inconstitucionais (ADI 221-DF).

Quanto ao número ou à quantidade de órgãos competentes para o exercício do controle de constitucionalidade, este pode ser: a) difuso; b) concentrado.

O controle difuso, que teve sua origem nos Estados Unidos com o julgamento do caso Marbury v. Madison, é aquele exercido por um pluralidade de órgãos. Permite-se a qualquer Juiz (ainda que não vitaliciado) ou Tribunal o reconhecimento da inconstitucionalidade de uma norma e, por via de consequência, a sua desaplicação ao caso concreto. Por isso mesmo é que todos os órgãos judiciários têm o poder-dever de não aplicar as leis inconstitucionais levadas a seu julgamento. O controle difuso, no Brasil, surgiu na primeira Constituição Republicana e persiste até os dias de hoje.

O controle concentrado é aquele exercido ou reservado a um ou a poucos órgãos criados especificamente para esse fim, ou que têm nessa atividade sua função principal, como se verifica na Alemanha e demais países da Europa Continental. Denomina-se também sistema austríaco.

No Brasil, o controle judicial é difuso e concentrado.

Quanto ao modo de manifestação, o controle pode ser: a) por via incidental; b) por via principal ou ação direta.

O controle se diz por via incidental quando desempenhado por Juízes e Tribunais na apreciação de casos concretos. A inconstitucionalidade é argüida incidentalmente no curso de uma demanda, e tem caráter prejudicial, pois se afigura como matéria a ser discutida antes pelo Juiz, como condição e antecedente lógico para a solução da pretensão deduzida em Juízo, na ação principal. É premissa para a resolução do conflito. A inconstitucionalidade não é o pedido ou o objeto principal da demanda, mas sua causa de pedir, seu fundamento jurídico.

O controle de constitucionalidade por via principal é aquele em que a inconstitucionalidade figura como o próprio pedido ou objeto da ação. Por meio das chamadas ações diretas, leva-se ao exame do Tribunal Constitucional a discussão acerca da validade ou não da lei em si. Há um processo objetivo, em que a legitimidade para suscitar o controle é restrita a determinados órgãos ou entidades. Nele não há defesa de interesses das partes, porque exercido fora de um caso concreto; há, sim, a defesa da constituição. O controle por via principal é originário do modelo austríaco. No Brasil, o controle por via principal se efetiva através da ação direta.

O controle também pode ser tipificado quanto à finalidade em: a) controle subjetivo; b) controle objetivo.

O controle subjetivo visa a defesa de direito ou interesse subjetivo juridicamente protegido pela parte e não propriamente a da Constituição.

O controle objetivo destina-se tão-somente à defesa objetiva da Constituição. Em nosso Direito, o controle difuso-incidental será sempre subjetivo, enquanto que o controle por via principal é, em princípio, objetivo.


Fonte: Direito Constitucional. Kildare Gonçalves Carvalho.