Culpabilidade é o juízo de
reprovação pessoa, que se realiza sobre a conduta típica e ilícita praticada
pelo agente. Duas teorias, surgidas por intermédio de correntes distintas, procuram
justificar esta censura.
A primeira, fruto da Escola
Clássica, prega o livre-arbítrio, sob o argumento de que o homem é moralmente
livre para fazer suas escolhas. O fundamento da responsabilidade penal está na
responsabilidade moral do indivíduo, a qual tem por base o livre-arbítrio.
A segunda teoria, com origem na
Escola Positiva, prega o determinismo. A corrente determinista aduz, ao
contrário, que o homem não é dotado desse poder soberano de liberdade de
escolha, mas sim que fatores internos ou externos podem influenciá-lo na
prática da infração penal.
Rogério Greco entende que livre
arbítrio e determinismo são conceitos que, ao invés de se repelirem, se
completam. Conclui que a culpabilidade, ou seja, o juízo de censura que recai
sobre a conduta típica e ilícita, é individual, pois o homem é um ser que
possui sua própria identidade, razão pela qual não existe um ser igual ao
outro. Em face disso, em tema de culpabilidade, todos os fatos, internos e
externos, devem ser considerados a fim de se apurar se o agente, nas condições
em que se encontrava, podia agir de outro modo.
-
sistema causal-naturalista de Liszt-Beling
De acordo com uma visão
analítica, Liszt e Beling dividiram o delito em dois aspectos: um externo e
outro interno. O aspecto externo, segundo a concepção de seus autores, compreendia
a ação típica e antijurídica. O interno dizia respeito à culpabilidade, sendo
esta o vínculo psicológico que unia o agente ao fato por ele praticado. O
delito, assim, era a ação típica, antijurídica e culpável.
A ação era concebida como
movimento humano voluntário, que causava uma modificação no mundo exterior. No
conceito de ação estava embutido, também, o de resultado. A vontade ou
voluntariedade na comissão ou na omissão significa isenção de coação mecânica
ou psicológica.
O tipo, na proposição inicial
de Beling, tinha a função fundamental de descrever objetivamente as condutas,
nele fazendo-se, ainda, a previsão do resultado.
A antijuridicidade compunha,
juntamente com a ação típica, o injusto penal. Sua caracterização limitava-se à
comprovação de que a conduta do agente contrariava a lei penal. Não havia
necessidade de se indagar sobre o elemento subjetivo do agente, já que a
antijuridicidade possuía natureza objetiva. As causas de exclusão da ilicitude,
por conseguinte, também eram auferidas objetivamente. A ilicitude possuía
natureza puramente formal.
No sistema proposto por Liszt e
Beling, a parte externa do delito, ou seja, o injusto penal, era objeto, sendo
na sua parte interna – a culpabilidade – aferidos os elementos subjetivos do
agente.
A culpabilidade, para esta
teoria, era o lugar adequado ao estudo dos elementos subjetivos – dolo e culpa.
Mais do que elementos, dolo e
culpa eram espécies de culpabilidade. A imputabilidade era tida como
pressuposto da culpabilidade. Antes de aferir dolo ou culpa, era preciso certificar-se
se o agente era imputável, ou seja, capaz de responder pelo injusto penal por
ele levado a efeito. Os elementos subjetivos eram responsáveis pelo
estabelecimento da relação psicológica entre o autor e o fato.
Culpabilidade, em suma,
significava o vínculo psicológico que ligava o agente ao fato ilícito por ele
cometido, razão pela qual essa teoria passou a ser reconhecida como “teoria
psicológica da culpabilidade”. Posteriormente, recebeu o nome de sistema
clássico.
O sistema causal-naturalista,
apesar de seu mérito inicial, começou a sofrer algumas críticas, uma vez que,
por exemplo, o conceito naturalístico de ação não conseguia explicar a essência
da omissão; a culpabilidade, como vínculo psicológico entre o agente e o fato,
não conseguia explicar a culpa inconsciente.
-
teoria normativa – sistema neoclássico – metodologia neokantista
Foram introduzidos elementos
subjetivos e normativos do tipo. De mera relação psicológica entre o agente e o
fato, a culpabilidade passou a constituir-se de um juízo de censura ou
reprovação pessoal, com base em elementos psiconormativos.
Para que o agente pudesse ser
punido pelo fato ilícito por ele cometido, não bastava a presença dos elementos
subjetivos (dolo e culpa), mas sim, que, nas condições em que se encontrava,
dele poderia ser exigida uma conduta conforme o direito. O conceito de exigibilidade
de conduta conforme a norma passou a refletir-se sobre toda a culpabilidade.
Com a introdução desse elemento de natureza normativa, os problemas que anteriormente
não conseguiam ser solucionados pela teoria clássica, como o da coação
irresistível, a obediência a ordem não manifestamente ilegal de superior
hierárquico e o estado de necessidade exculpante, já poderiam ser tratados no
campo da culpabilidade.
A estrutura a culpabilidade,
pela teoria normativa, ficaria com o seguinte conteúdo: a) imputabilidade; b)
dolo e culpa; c) exigibilidade de conduta diversa.
Imputabilidade seria
possibilidade de se responsabilizar alguém pela prática de determinado fato
previsto pela lei penal. Para tanto, teria o agente de possuir condições para
entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse
entendimento.
Dolo seria a vontade e a
consciência de realizar o fato proibido pela lei e a culpa, uma vontade
defeituosa. O dolo passou a ser entendido como um dolus malus, exigindo-se para sua caracterização, além da vontade
de realizar o fato típico, o conhecimento da ilicitude do fato.
O conceito de não exigibilidade
passou a ser considerado como causa geral de exclusão da culpabilidade.
-
teoria da ação final
A teoria finalista modificou
profundamente o sistema causal. A começar pela ação, que agora não mais podia
dissociar-se da sua finalidade. Toda conduta humana vem impregnada de
finalidade, seja lícita ou não. Partindo dessa premissa, o dolo não mais podia
ser analisado na culpabilidade. Welzel o transportou para o tipo, dele
afastando sua carga normativa, isto é, a consciência sobre a ilicitude do fato.
O dolo finalista é um dolo natural, livre da necessidade de se aferir a
consciência sobre a ilicitude do fato par a sua configuração. Na verdade, o
elemento subjetivo foi conduzido para a ação e através dela que se percebe a
finalidade do agente. A adequação da conduta ao modelo abstrato previsto pela
lei penal (tipo) somente pode ser realizado com perfeição se conseguida a
visualização da finalidade do agente.
O finalismo resolvia com
perfeição o problema do dolo, pois que este se confundia com a própria
finalidade da conduta. Contudo, dizia-se que tal raciocínio não podia ser
aplicado aos delitos culposos.
Os tipos penais, na concepção
finalista, passaram a considerar-se complexos, uma vez que neles deviam
fundir-se os elementos de natureza objetiva com aqueles de natureza subjetiva
(dolo e culpa).
A antijuridicidade, como
predicado da ação típica, também deveria vir impregnada do mesmo elemento
subjetivo desta última. O injusto penal (ação típica e antijurídica), portanto,
não mais seria tido como objetivo, como na primitiva concepção de Liszt-Beling,
pois que nele deveria verificar-se o seu elemento subjetivo.
Na culpabilidade permaneceram
somente os seus elementos de natureza normativa, razão pela qual a teoria final
é reconhecida como uma “teoria normativa pura”. A culpabilidade, portanto,
passa a constituir-se pela: a) imputabilidade; b) potencial consciência da
ilicitude do fato; c) exigibilidade de conduta diversa.
-
teoria social da ação
Define a ação como fenômeno
social, procurando englobar aspectos do causalismo e do finalismo. Essa ideia
apresenta duas dificuldades: a) a impossibilidade de se oferecer, até agora, um
conceito preciso para a aventada relevância social da conduta; b) na imprestabilidade
prática de um conceito de ação que implique um juízo de valor de tal ordem, que
já diga respeito, no fundo, ao conteúdo social do fato, isto é, de conformidade
ou desconformidade com a estruturação dos mandamentos coletivos.
A teoria social da ação vem
sendo repudiada pela maior parte dos doutrinadores. Zaffaroni chega a dizer que
o “suposto conceito social de conduta, que de modo algum serve de ponte entre o
causalismo e o finalismo, padece dos mesmos defeitos de qualquer conceito
teórico nebuloso: na melhor das hipóteses, resulta estéril, porque não se pode
extrair dele nenhuma consequência prática.
-
funcionalismo
A partir da década de 70
começou-se a discutir e a se desenvolver um sistema entendido como
racional-final (ou teleológico) ou funcional do Direito Penal.
Com o funcionalismo pretende-se
levar a efeito uma nova sistematização jurídico-penal. Como o próprio nome induz, o funcionalismo parte dos pressupostos político-criminais ligados
diretamente às funções do Direito Penal, principalmente no que diz respeito à
chamada “teoria dos fins da pena”.
Considerando a estrutura lógica
do crime, o sistema funcional trabalha com duas vigas mestras: a teoria da
imputação objetiva e a ampliação da culpabilidade para a categoria de
responsabilidade. A primeira delas, nos crimes de resultado, passa a exigir,
além da relação material de causalidade, um nexo normativo de causalidade, a
fim de aferir se o resultado produzido pelo agente pode, juridicamente, ser a
ele imputado. A segunda coluna do funcionalismo, ampliando o conceito de
culpabilidade, para o de responsabilidade, exige, sempre, a aferição da
necessidade preventiva (especial ou geral) da pena, sem a qual se torna
impossível a imposição desta.
Muñoz Conde, analisando o
conceito de responsabilidade introduzido por Roxin, aduz que para este último a
responsabilidade penal pressupõe não somente a culpabilidade do autor, senão,
ademais, a necessidade da pena desde o ponto de vista preventivo geral e
especial. Para Roxin, as necessidades preventivas nunca podem conduzir a
imposição de uma pena a um sujeito que não é culpável. Mas a culpabilidade em
si mesma tampouco pode legitimar a imposição de uma pena, se esta não é
necessária desde o ponto de vista preventivo.
-
culpabilidade de ato e culpabilidade de autor
É possível falar de um Direito
Penal do fato e de um Direito Penal do autor. No primeiro caso, há uma
regulamentação legal, em virtude da qual a punibilidade se vincula a uma ação
concreta descrita tipicamente e a sanção representa somente a resposta ao fato
individual, e não a toda condução de vida do autor ou aos perigos que no
futuro se esperam. Ao contrário, se tratará de um Direito Penal do autor quando
a pena se vincule à sua personalidade e sejam determinantes a antissociedade e
seu grau.
Um Direito Penal exclusivamente
do autor é um direito intolerável porque não se julga, não se avalia aquilo que
o homem faz, mas, sim, o que ele é.
Apesar da adoção de um moderado
Direito Penal do fato, é possível distinguir-se, ainda, entre culpabilidade de
ato e culpabilidade de autor. A primeira seria a reprovação do homem por aquilo
que ele fez, considerando-se a sua capacidade de autodeterminação; já na
culpabilidade de autor, o que se reprova é o homem como ele é, e não aquilo que
fez.
-
elementos da culpabilidade (concepção finalista)
Nos moldes da concepção trazida
pelo finalismo de Welzel, a culpabilidade é composta pelos seguintes elementos
normativos: a) imputabilidade; b) potencial conhecimento sobre a ilicitude do
fato; c) exigibilidade de conduta diversa.
a)
imputabilidade (capacidade de culpabilidade)
Para que o agente possa ser
responsável pelo fato típico e ilícito por ele cometido, é preciso que seja
imputável. A imputabilidade é a possibilidade de se atribuir, imputar o fato
típico e ilícito ao agente. A imputabilidade é a rega.
O Código Penal erigiu as
hipóteses que, segundo critério político-legislativo, conduziriam à
inimputabilidade do agente: i) inimputabilidade por doença mental; ii)
inimputabilidade por imaturidade natural.
Significa, portanto, que o
Código Penal adotou o critério biopsicológico para a aferição da inimputabilidade
do agente, pois, conjugam-se dois critérios: a) existência de uma doença mental
ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado; b) absoluta incapacidade de,
ao tempo da ação ou omissão, entender o caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento.
O critério biológico reside da
verificação da doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado.
Contudo, mesmo que comprovado, ainda não será suficiente para conduzir à
situação de inimputabilidade. Será preciso constatar se o agente era, ao tempo
da ação ou omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato
ou de determinar-se de acordo com esse entendimento (critério psicológico).
Merece ser ressaltado que, se
comprovada a total inimputabilidade do agente, deverá ele ser absolvido, nos
termos do inciso VI do artigo 386 do Código de Processo Penal, aplicando-se-lhe
medida de segurança. Daí dizer-se que tal sentença é impropriamente absolutória,
uma vez que, embora absolvendo o inimputável, é cominada medida de segurança.
O parágrafo único do artigo 26
do Código Penal prevê, ainda, uma redução da pena de um a dois terços para
aquele que, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento
mental incompleto ou retardado, não era inteiramente incapaz de entender o
caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Se o condenado, na hipótese do
parágrafo único do artigo 26 do Código Penal, necessitar de especial tratamento
curativo, poderá o Juiz, com base em seu artigo 98 , substituir a
pena privativa de liberdade pela internação ou tratamento ambulatorial, pelo
prazo mínimo de um a três anos (artigo 97 e §§ do CP).
A inimputabilidade por
imaturidade natural ocorre em virtude de uma presunção legal onde, por questões
de política criminal, entendeu o legislador que os menores de 18
anos não gozam de plena capacidade de entendimento que lhes permita imputar a
prática de um fato típico e ilícito. Adotou-se, portanto, o critério biológico.
Tomado conhecimento de que um
agente comprovadamente inimputável praticou um fato típico e antijurídico, deve
o Promotor de Justiça denunciá-lo, narrando os fatos por ele
cometidos, para que, durante a instrução do processo possa ser assegurada sua
ampla defesa, e, ao final da peça acusatória, deverá o membro do Ministério
Público, mencionando a causa dirimente da culpabilidade, pugnar pela absolvição
do réu, com a consequente aplicação de medida de segurança. Não haverá
possibilidade, nessa hipótese, de ser formulado pedido condenatório, haja vista
que a peça seria rejeitada por faltar-lhe uma das condições necessárias
ao regular direito de ação, qual seja, a possibilidade jurídica do pedido.
Situação diversa é a do
chamando semi-imputável que pratica um fato típico, ilícito e culpável. Em virtude de não ter tido pleno conhecimento do caráter ilícito do
fato, sua pena deverá ser reduzida de um a dois terços. Condena-se o
semi-imputável, é reduzida a pena imposta, razão pela qual deverá estar
consignado na peça inicial de acusação o pedido de condenação.
Ao inimputável deverá ser
aplicada medida de segurança, como consequência necessária à sua absolvição em
face da existência de uma causa de isenção de pena. Ao semi-imputável impõe-se
uma condenação, fazendo incidir, contudo, redução na pena que lhe for
aplicada.
O inciso I do artigo 28 do
Código Penal assevera que a emoção ou a paixão não excluem a inimputabilidade
penal, entretanto, a lei valorou tais sentimentos, seja para diminuir a pena ou
mesmo para aumentar a sanção cominada.
O inciso II do artigo 28 do
Código Penal diz também não excluir a imputabilidade penal a embriaguez
voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos.
A lei diz ser isento de pena o
agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força
maior, era, ao tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz de entender o
caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
A embriaguez voluntária é
aquela prevista no inciso II do artigo 28 do Código Penal e, mesmo sendo
completa, permite a punição do agente, em face da teoria da actio libera in causa, segundo a qual os
casos em que alguém, no estado de não-imputabilidade, é causador, por ação ou
omissão, de algum resultado punível, tendo se colocado naquele estado, ou
propositadamente, com a intenção de produzir o efeito lesivo, ou sem essa
intenção, mas prevendo a possibilidade do resultado, ou, ainda, quando a
podia ou devia prever.
A embriaguez voluntária se
divide em voluntária em sentido estrito e culposa. No primeiro caso, o agente,
volitivamente, faz ingestão de bebidas alcoólicas com a finalidade de se embriagar.
Culposa é aquela espécie de embriaguez em que o agente não faz a ingestão de
bebidas alcoólicas querendo embriagar-se, mas, deixando de observar o seu dever
de cuidado, ingere quantidade suficiente que o coloca em estado de embriaguez.
Nas duas espécies de embriaguez
voluntária, o agente será responsabilizado pelos seus atos, mesmo que, ao tempo
da ação ou omissão, seja inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do
fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Sua ação, como diz a
teoria da actio libera in causa, foi
livre na causa, ou seja, no ato de ingerir bebida alcoólica, assim, poderá o agente
ser responsabilizado criminalmente pelo resultado.
Pela definição de actio libera in causa, o agente pode
embriagar-se preordenadamente, com a finalidade de praticar uma infração penal,
oportunidade em que, se vier a cometê-la, o resultado lhe será imputado a
título de dolo, sendo, ainda, agravada a pena em razão da existência da
circunstância prevista no artigo 61, inciso II, alínea “l” do Código Penal, ou,
querendo embriagar-se, mas sem a finalidade de praticar qualquer infração
penal, se o agente vier a causar um resultado lesivo, este lhe poderá ser
atribuído, geralmente, a título de culpa.
A embriaguez involuntária pode
ser proveniente de caso fortuito ou força maior.
Para que seja afastada a
culpabilidade do agente, isentando-o de pena, é preciso, conforme determina o
artigo 28, inciso II, § 1º do Código Penal, que a involuntária e completa
embriaguez do agente seja conjugada com sua total incapacidade de entender o
caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento.
Também é isento de penal o
agente, nos termos do artigo 45 da Lei de Entorpecentes, sob o efeito de droga,
proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou omissão,
inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se
de acordo com esse entendimento, qualquer que tenha sido a infração penal
praticada.
A embriaguez involuntária
incompleta é prevista no § 2º do inciso II do artigo 28 do Código Penal,
segundo o qual a pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, por
embriaguez, proveniente de caso fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo
da ação ou omissão, plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato
ou determinar-se de acordo com esse entendimento.
Embora o inciso II do artigo 28
e seus parágrafos cuidem das diversas espécies de embriaguez, devem ser
excluídas delas a chamada embriaguez patológica.
b)
potencial consciência da ilicitude do fato
O erro de tipo incidirá sobre
os elementos, circunstâncias ou qualquer outro dado que se agregue à figura
típica. O erro de proibição, ao contrário, não é estudado no tipo penal, mas,
sim, quando da verificação da culpabilidade do agente. Com o erro de proibição
procura-se verificar se nas circunstâncias em que se encontrava o agente tinha ele
condições de compreender o fato que praticava era ilícito.
A diferença fundamental entre
consciência real e consciência potencial sobre a ilicitude do fato é que,
naquela, o agente deve, efetivamente, saber que a conduta que pratica é ilícita;
na consciência potencial, basta a possibilidade que o agente tinha, no caso
concreto, de alcançar esse conhecimento. Daí o conceito de consciência da
ilicitude como a capacidade de o agente de uma conduta proibida, na atuação
concreta, apreender a ilicitude de seu comportamento.
O erro sobre a ilicitude do
fato, ou erro de proibição, pode ser: a) direto; b) indireto; c) mandamental.
Diz-se direto quando o agente
vem a recair sobre o conteúdo proibitivo de uma norma penal. O agente, por erro
inevitável, realiza uma conduta proibida, por desconhecer a norma
proibitiva, por conhece-la mal, ou por não compreender o seu verdadeiro
âmbito de incidência.
Erro de proibição indireto é a
suposição errônea de uma causa de justificação, se o autor erra sobre a
existência ou os limites da proposição permissiva (erro de permissão).
Para a teoria limitada da
culpabilidade, se o erro do agente recair sobre uma situação fática que, se
existisse, tornaria a ação legítima, será considerado erro de tipo; agora, se
incidir sobre a existência ou limites de uma causa de justificação, o
erro será de proibição.
A teoria extremada da culpabilidade não faz distinção
entre o erro que recai sobre uma situação de fato, sobre a existência ou limites de uma causa de justificação, pois que para ela todos são
considerados erros de proibição.
Para Jescheck, o erro incidente
sobre uma situação de fato, que ocorre nas discriminantes putativas, não pode
ser considerado erro de tipo e tampouco erro de proibição. Para o autor, tal
hipótese caracteriza-se como um erro sui
generis.
Erro mandamental é aquele que
incide sobre o mandamento contido nos crimes omissivos, sejam eles próprios ou
impróprios. É o erro que recai sobre uma norma mandamental, impositiva, que manda fazer e que está implícita, evidentemente,
em todos os crimes omissivos.
Nos delitos omissivos deve-se
distinguir o erro que recai sobre a situação objetiva da que se deriva a
posição do garantidor, cujo desconhecimento dará lugar a um erro de tipo; o
desconhecimento do dever de cuidado oriundo dessa posição deve dar lugar ao erro de proibição.
Tal como acontece com o erro de
tipo, o erro de proibição pode ser evitável (vencível, inescusável) ou
inevitável (invencível, escusável). Suas consequências, contudo, são diferentes.
A finalidade precípua do erro de tipo é afastar o dolo da conduta do
agente, seja ele escusável ou inescusável. Entretanto, se o erro de tipo for
considerado escusável, eliminará o dolo e a culpa; se inescusável, ainda
continuará a afastar a conduta dolosa, mas permitirá a punição do agente por um
crime culposo, se previsto em lei.
Se evitável o erro, o fato praticado
será típico, ilícito e culpável. Contudo, como laborou em erro, a
reprovabilidade sobre o injusto penal por ele realizado será menor, razão pela
qual sua pena será diminuída de um sexto a um terço.
c)
exigibilidade de conduta diversa
Seu conceito é muito amplo e
abrange até mesmo as duas situações anteriormente colocadas – imputabilidade e
potencial consciência da ilicitude do fato – que têm como finalidade afastar a culpabilidade do agente. Se o autor era inimputável, pois que, ao
tempo da ação ou omissão, era inteiramente incapaz de entender o caráter
ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento, não se lhe
podia exigir uma conduta conforme o Direito; da mesma forma aquele que atua não
possuindo a necessária consciência sobre a ilicitude do fato. Todas as causas
dirimentes da culpabilidade desembocarão na chamada inexigibilidade de conduta
diversa, haja vista que, nas condições em que se encontrava o agente, não se
podia exigir dele outro comportamento.
O Código Penal prevê algumas
causas legais que excluem a culpabilidade e, dentre elas, estão: coação
irresistível, obediência hierárquica e a possibilidade de aborto quando a gravidez
é resultante de estupro. Ressalte-se que mencionada coação é aquela de natureza
moral (vis compulsiva). Isso porque a
coação física afasta a própria conduta do agente, por ausência de dolo ou
culpa. Nos casos de coação resistível, embora o fato seja considerado típico,
ilícito e culpável, poderá ao agente ser aplicada a circunstância atenuante
prevista no artigo 65, inciso III, alínea “c”, primeira parte do Código Penal.
A estrita obediência a ordem
não manifestamente ilegal de superior hierárquico afasta a culpabilidade do
agente em virtude de não lhe ser exigível, nessas condições, um comportamento
conforme o Direito. Para que possa ser beneficiado com essa causa legal de exclusão
da culpabilidade, é preciso a presença dos requisitos: ordem proferida por
superior hierárquico; ordem não manifestamente ilegal; comprimento da ordem
adstrito a seus limites. Se o crime for cometido em razão da ordem de
autoridade, tem aplicação a circunstância atenuante prevista no artigo 65,
inciso III, alínea “c”, segunda parte do Código Penal.
Causas supralegais de exclusão
da culpabilidade são aquelas que, embora não estejam previstas expressamente em
algum texto legal, são aplicadas em virtude dos princípios informadores do
ordenamento jurídico. Nossa legislação penal não proíbe a utilização do argumento
da inexigibilidade de conduta diversa como causa supralegal de exclusão da
culpabilidade.
Existem situações que fazem com
que algumas pessoas se recusem, terminantemente, a cumprir as determinações
legais em virtude de sua consciência. Quando não há alternativa para a objeção
de consciência, o agente deverá, mesmo aviltando seus princípios, cumprir a lei? Rogério Greco entende que, em muitas
situações, atendendo a um critério de razoabilidade, poderá ser arguida a
inexigibilidade de conduta diversa com a finalidade de afastar a infração penal
atribuída ao agente.
Nos julgamentos realizados pelo
Tribunal do Júri era observada resistência no que dizia respeito à aceitação da
tese da inexigibilidade de conduta diversa como causa supralegal da exclusão da
culpabilidade em virtude da redação constante do revogado artigo 484, inciso
III do Código de Processo Penal que, supostamente, permitia a formulação de
quesitos se o réu apresentasse, na sua defesa, ou alegasse, nos debates,
qualquer fato ou circunstância que, por lei, o isentasse de pena, ou, ainda, desclassificasse sua conduta. Hoje, a discussão resta superada, pois a nova redação dos
artigos 482 e 483 do Código de Processo Penal[1]
permite concluir pela sua total aplicação.
Dessa forma, tal como ocorre
com a legítima defesa, onde não existe mais a possibilidade de desdobrar os
quesitos, analisando cada um dos seus elementos (injusta agressão, uso moderado
dos meios necessários, atualidade ou eminência, defesa própria ou de terceiro),
as partes discutirão se o agente, na situação em que se encontrava, tinha
possibilidade de agir de forma diferente. Esse fato, levado ao conhecimento do
Conselho de Sentença, fará com que o jurado decida se absolve ou condena o
acusado.
-
co-culpabilidade
A teoria da co-culpabilidade
ingressa no mundo do Direito Penal para apontar e evidenciar a parcela de
responsabilidade que deve ser atribuída à sociedade quando da prática de
determinadas infrações penais.
Na prática, como é possível
levar a efeito essa divisão de responsabilidade entre a sociedade e aquele que,
em virtude de sua situação de exclusão social, praticou determinada infração
penal? Não se pode, obviamente, pedir a cada membro da sociedade que cumpra um
pouco da pena a ser aplicada. Assim, a doutrina leciona que há duas opções: a primeira,
dependendo da situação de exclusão social que se encontre a pessoa que, em
tese, praticou um dato definido como crime, será a sua absolvição; a segunda, a
aplicação do artigo 66 do Código Penal[2].
Fonte: Curso de Direito Penal –
Parte Geral. Rogério Grecco.
[1] Art.
482. O Conselho de Sentença será questionado sobre matéria de fato e se o
acusado deve ser absolvido.
Parágrafo único. Os quesitos serão redigidos em proposições afirmativas,
simples e distintas, de modo que cada um deles possa ser respondido com
suficiente clareza e necessária precisão. Na sua elaboração, o presidente levará
em conta os termos da pronúncia ou das decisões posteriores que julgaram
admissível a acusação, do interrogatório e das alegações das partes.
Art. 483. Os quesitos serão formulados na seguinte ordem, indagando
sobre:
I – a materialidade do fato;
II – a autoria ou participação;
III – se o acusado deve ser absolvido;
IV – se existe causa de diminuição de pena alegada pela defesa;
V – se existe circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena reconhecidas
na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação.
§ 1o A resposta negativa, de mais de 3 (três) jurados,
a qualquer dos quesitos referidos nos incisos I e II do caput deste
artigo encerra a votação e implica a absolvição do acusado.
§ 2o Respondidos afirmativamente por mais de 3 (três)
jurados os quesitos relativos aos incisos I e II do caput deste
artigo será formulado quesito com a seguinte redação:
O jurado absolve o acusado?
§ 3o Decidindo os jurados pela condenação, o julgamento
prossegue, devendo ser formulados quesitos sobre:
I – causa de diminuição de pena alegada pela defesa;
II – circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena, reconhecidas na
pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação.
§ 4o Sustentada a desclassificação da infração para
outra de competência do juiz singular, será formulado quesito a respeito, para
ser respondido após o 2o (segundo) ou 3o (terceiro)
quesito, conforme o caso.
§ 5o Sustentada a tese de ocorrência do crime na sua
forma tentada ou havendo divergência sobre a tipificação do delito, sendo este
da competência do Tribunal do Júri, o juiz formulará quesito acerca destas
questões, para ser respondido após o segundo quesito.
§ 6o Havendo mais de um crime ou mais de um acusado, os
quesitos serão formulados em séries distintas.
[2] Art. 66
- A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante,
anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei.