terça-feira, 30 de outubro de 2012

Culpabilidade


Culpabilidade é o juízo de reprovação pessoa, que se realiza sobre a conduta típica e ilícita praticada pelo agente. Duas teorias, surgidas por intermédio de correntes distintas, procuram justificar esta censura.
A primeira, fruto da Escola Clássica, prega o livre-arbítrio, sob o argumento de que o homem é moralmente livre para fazer suas escolhas. O fundamento da responsabilidade penal está na responsabilidade moral do indivíduo, a qual tem por base o livre-arbítrio.
A segunda teoria, com origem na Escola Positiva, prega o determinismo. A corrente determinista aduz, ao contrário, que o homem não é dotado desse poder soberano de liberdade de escolha, mas sim que fatores internos ou externos podem influenciá-lo na prática da infração penal.
Rogério Greco entende que livre arbítrio e determinismo são conceitos que, ao invés de se repelirem, se completam. Conclui que a culpabilidade, ou seja, o juízo de censura que recai sobre a conduta típica e ilícita, é individual, pois o homem é um ser que possui sua própria identidade, razão pela qual não existe um ser igual ao outro. Em face disso, em tema de culpabilidade, todos os fatos, internos e externos, devem ser considerados a fim de se apurar se o agente, nas condições em que se encontrava, podia agir de outro modo.
- sistema causal-naturalista de Liszt-Beling
De acordo com uma visão analítica, Liszt e Beling dividiram o delito em dois aspectos: um externo e outro interno. O aspecto externo, segundo a concepção de seus autores, compreendia a ação típica e antijurídica. O interno dizia respeito à culpabilidade, sendo esta o vínculo psicológico que unia o agente ao fato por ele praticado. O delito, assim, era a ação típica, antijurídica e culpável.
A ação era concebida como movimento humano voluntário, que causava uma modificação no mundo exterior. No conceito de ação estava embutido, também, o de resultado. A vontade ou voluntariedade na comissão ou na omissão significa isenção de coação mecânica ou psicológica.
O tipo, na proposição inicial de Beling, tinha a função fundamental de descrever objetivamente as condutas, nele fazendo-se, ainda, a previsão do resultado.

A antijuridicidade compunha, juntamente com a ação típica, o injusto penal. Sua caracterização limitava-se à comprovação de que a conduta do agente contrariava a lei penal. Não havia necessidade de se indagar sobre o elemento subjetivo do agente, já que a antijuridicidade possuía natureza objetiva. As causas de exclusão da ilicitude, por conseguinte, também eram auferidas objetivamente. A ilicitude possuía natureza puramente formal.
No sistema proposto por Liszt e Beling, a parte externa do delito, ou seja, o injusto penal, era objeto, sendo na sua parte interna – a culpabilidade – aferidos os elementos subjetivos do agente.
A culpabilidade, para esta teoria, era o lugar adequado ao estudo dos elementos subjetivos – dolo e culpa.
Mais do que elementos, dolo e culpa eram espécies de culpabilidade. A imputabilidade era tida como pressuposto da culpabilidade. Antes de aferir dolo ou culpa, era preciso certificar-se se o agente era imputável, ou seja, capaz de responder pelo injusto penal por ele levado a efeito. Os elementos subjetivos eram responsáveis pelo estabelecimento da relação psicológica entre o autor e o fato.
Culpabilidade, em suma, significava o vínculo psicológico que ligava o agente ao fato ilícito por ele cometido, razão pela qual essa teoria passou a ser reconhecida como “teoria psicológica da culpabilidade”. Posteriormente, recebeu o nome de sistema clássico.
O sistema causal-naturalista, apesar de seu mérito inicial, começou a sofrer algumas críticas, uma vez que, por exemplo, o conceito naturalístico de ação não conseguia explicar a essência da omissão; a culpabilidade, como vínculo psicológico entre o agente e o fato, não conseguia explicar a culpa inconsciente.
- teoria normativa – sistema neoclássico – metodologia neokantista
Foram introduzidos elementos subjetivos e normativos do tipo. De mera relação psicológica entre o agente e o fato, a culpabilidade passou a constituir-se de um juízo de censura ou reprovação pessoal, com base em elementos psiconormativos.
Para que o agente pudesse ser punido pelo fato ilícito por ele cometido, não bastava a presença dos elementos subjetivos (dolo e culpa), mas sim, que, nas condições em que se encontrava, dele poderia ser exigida uma conduta conforme o direito. O conceito de exigibilidade de conduta conforme a norma passou a refletir-se sobre toda a culpabilidade. Com a introdução desse elemento de natureza normativa, os problemas que anteriormente não conseguiam ser solucionados pela teoria clássica, como o da coação irresistível, a obediência a ordem não manifestamente ilegal de superior hierárquico e o estado de necessidade exculpante, já poderiam ser tratados no campo da culpabilidade.
A estrutura a culpabilidade, pela teoria normativa, ficaria com o seguinte conteúdo: a) imputabilidade; b) dolo e culpa; c) exigibilidade de conduta diversa.
Imputabilidade seria possibilidade de se responsabilizar alguém pela prática de determinado fato previsto pela lei penal. Para tanto, teria o agente de possuir condições para entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Dolo seria a vontade e a consciência de realizar o fato proibido pela lei e a culpa, uma vontade defeituosa. O dolo passou a ser entendido como um dolus malus, exigindo-se para sua caracterização, além da vontade de realizar o fato típico, o conhecimento da ilicitude do fato.
O conceito de não exigibilidade passou a ser considerado como causa geral de exclusão da culpabilidade.
- teoria da ação final
A teoria finalista modificou profundamente o sistema causal. A começar pela ação, que agora não mais podia dissociar-se da sua finalidade. Toda conduta humana vem impregnada de finalidade, seja lícita ou não. Partindo dessa premissa, o dolo não mais podia ser analisado na culpabilidade. Welzel o transportou para o tipo, dele afastando sua carga normativa, isto é, a consciência sobre a ilicitude do fato. O dolo finalista é um dolo natural, livre da necessidade de se aferir a consciência sobre a ilicitude do fato par a sua configuração. Na verdade, o elemento subjetivo foi conduzido para a ação e através dela que se percebe a finalidade do agente. A adequação da conduta ao modelo abstrato previsto pela lei penal (tipo) somente pode ser realizado com perfeição se conseguida a visualização da finalidade do agente.
O finalismo resolvia com perfeição o problema do dolo, pois que este se confundia com a própria finalidade da conduta. Contudo, dizia-se que tal raciocínio não podia ser aplicado aos delitos culposos.
Os tipos penais, na concepção finalista, passaram a considerar-se complexos, uma vez que neles deviam fundir-se os elementos de natureza objetiva com aqueles de natureza subjetiva (dolo e culpa).
A antijuridicidade, como predicado da ação típica, também deveria vir impregnada do mesmo elemento subjetivo desta última. O injusto penal (ação típica e antijurídica), portanto, não mais seria tido como objetivo, como na primitiva concepção de Liszt-Beling, pois que nele deveria verificar-se o seu elemento subjetivo.
Na culpabilidade permaneceram somente os seus elementos de natureza normativa, razão pela qual a teoria final é reconhecida como uma “teoria normativa pura”. A culpabilidade, portanto, passa a constituir-se pela: a) imputabilidade; b) potencial consciência da ilicitude do fato; c) exigibilidade de conduta diversa.
- teoria social da ação
Define a ação como fenômeno social, procurando englobar aspectos do causalismo e do finalismo. Essa ideia apresenta duas dificuldades: a) a impossibilidade de se oferecer, até agora, um conceito preciso para a aventada relevância social da conduta; b) na imprestabilidade prática de um conceito de ação que implique um juízo de valor de tal ordem, que já diga respeito, no fundo, ao conteúdo social do fato, isto é, de conformidade ou desconformidade com a estruturação dos mandamentos coletivos.
A teoria social da ação vem sendo repudiada pela maior parte dos doutrinadores. Zaffaroni chega a dizer que o “suposto conceito social de conduta, que de modo algum serve de ponte entre o causalismo e o finalismo, padece dos mesmos defeitos de qualquer conceito teórico nebuloso: na melhor das hipóteses, resulta estéril, porque não se pode extrair dele nenhuma consequência prática.
- funcionalismo
A partir da década de 70 começou-se a discutir e a se desenvolver um sistema entendido como racional-final (ou teleológico) ou funcional do Direito Penal.
Com o funcionalismo pretende-se levar a efeito uma nova sistematização jurídico-penal. Como o próprio nome induz, o funcionalismo parte dos pressupostos político-criminais ligados diretamente às funções do Direito Penal, principalmente no que diz respeito à chamada “teoria dos fins da pena”.
Considerando a estrutura lógica do crime, o sistema funcional trabalha com duas vigas mestras: a teoria da imputação objetiva e a ampliação da culpabilidade para a categoria de responsabilidade. A primeira delas, nos crimes de resultado, passa a exigir, além da relação material de causalidade, um nexo normativo de causalidade, a fim de aferir se o resultado produzido pelo agente pode, juridicamente, ser a ele imputado. A segunda coluna do funcionalismo, ampliando o conceito de culpabilidade, para o de responsabilidade, exige, sempre, a aferição da necessidade preventiva (especial ou geral) da pena, sem a qual se torna impossível a imposição desta.
Muñoz Conde, analisando o conceito de responsabilidade introduzido por Roxin, aduz que para este último a responsabilidade penal pressupõe não somente a culpabilidade do autor, senão, ademais, a necessidade da pena desde o ponto de vista preventivo geral e especial. Para Roxin, as necessidades preventivas nunca podem conduzir a imposição de uma pena a um sujeito que não é culpável. Mas a culpabilidade em si mesma tampouco pode legitimar a imposição de uma pena, se esta não é necessária desde o ponto de vista preventivo.
- culpabilidade de ato e culpabilidade de autor
É possível falar de um Direito Penal do fato e de um Direito Penal do autor. No primeiro caso, há uma regulamentação legal, em virtude da qual a punibilidade se vincula a uma ação concreta descrita tipicamente e a sanção representa somente a resposta ao fato individual, e não a toda condução de vida do autor ou aos perigos que no futuro se esperam. Ao contrário, se tratará de um Direito Penal do autor quando a pena se vincule à sua personalidade e sejam determinantes a antissociedade e seu grau.
Um Direito Penal exclusivamente do autor é um direito intolerável porque não se julga, não se avalia aquilo que o homem faz, mas, sim, o que ele é.
Apesar da adoção de um moderado Direito Penal do fato, é possível distinguir-se, ainda, entre culpabilidade de ato e culpabilidade de autor. A primeira seria a reprovação do homem por aquilo que ele fez, considerando-se a sua capacidade de autodeterminação; já na culpabilidade de autor, o que se reprova é o homem como ele é, e não aquilo que fez.
- elementos da culpabilidade (concepção finalista)
Nos moldes da concepção trazida pelo finalismo de Welzel, a culpabilidade é composta pelos seguintes elementos normativos: a) imputabilidade; b) potencial conhecimento sobre a ilicitude do fato; c) exigibilidade de conduta diversa.
a) imputabilidade (capacidade de culpabilidade)
Para que o agente possa ser responsável pelo fato típico e ilícito por ele cometido, é preciso que seja imputável. A imputabilidade é a possibilidade de se atribuir, imputar o fato típico e ilícito ao agente. A imputabilidade é a rega.
O Código Penal erigiu as hipóteses que, segundo critério político-legislativo, conduziriam à inimputabilidade do agente: i) inimputabilidade por doença mental; ii) inimputabilidade por imaturidade natural.
Significa, portanto, que o Código Penal adotou o critério biopsicológico para a aferição da inimputabilidade do agente, pois, conjugam-se dois critérios: a) existência de uma doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado; b) absoluta incapacidade de, ao tempo da ação ou omissão, entender o caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento.
O critério biológico reside da verificação da doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado. Contudo, mesmo que comprovado, ainda não será suficiente para conduzir à situação de inimputabilidade. Será preciso constatar se o agente era, ao tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento (critério psicológico).
Merece ser ressaltado que, se comprovada a total inimputabilidade do agente, deverá ele ser absolvido, nos termos do inciso VI do artigo 386 do Código de Processo Penal, aplicando-se-lhe medida de segurança. Daí dizer-se que tal sentença é impropriamente absolutória, uma vez que, embora absolvendo o inimputável, é cominada medida de segurança.
O parágrafo único do artigo 26 do Código Penal prevê, ainda, uma redução da pena de um a dois terços para aquele que, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado, não era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Se o condenado, na hipótese do parágrafo único do artigo 26 do Código Penal, necessitar de especial tratamento curativo, poderá o Juiz, com base em seu artigo 98 , substituir a pena privativa de liberdade pela internação ou tratamento ambulatorial, pelo prazo mínimo de um a três anos (artigo 97 e §§ do CP).
A inimputabilidade por imaturidade natural ocorre em virtude de uma presunção legal onde, por questões de política criminal, entendeu o legislador que os menores de 18 anos não gozam de plena capacidade de entendimento que lhes permita imputar a prática de um fato típico e ilícito. Adotou-se, portanto, o critério biológico.
Tomado conhecimento de que um agente comprovadamente inimputável praticou um fato típico e antijurídico, deve o Promotor de Justiça denunciá-lo, narrando os fatos por ele cometidos, para que, durante a instrução do processo possa ser assegurada sua ampla defesa, e, ao final da peça acusatória, deverá o membro do Ministério Público, mencionando a causa dirimente da culpabilidade, pugnar pela absolvição do réu, com a consequente aplicação de medida de segurança. Não haverá possibilidade, nessa hipótese, de ser formulado pedido condenatório, haja vista que a peça seria rejeitada por faltar-lhe uma das condições necessárias ao regular direito de ação, qual seja, a possibilidade jurídica do pedido.
Situação diversa é a do chamando semi-imputável que pratica um fato típico, ilícito e culpável. Em virtude de não ter tido pleno conhecimento do caráter ilícito do fato, sua pena deverá ser reduzida de um a dois terços. Condena-se o semi-imputável, é reduzida a pena imposta, razão pela qual deverá estar consignado na peça inicial de acusação o pedido de condenação.
Ao inimputável deverá ser aplicada medida de segurança, como consequência necessária à sua absolvição em face da existência de uma causa de isenção de pena. Ao semi-imputável impõe-se uma condenação, fazendo incidir, contudo, redução na pena que lhe for aplicada.
O inciso I do artigo 28 do Código Penal assevera que a emoção ou a paixão não excluem a inimputabilidade penal, entretanto, a lei valorou tais sentimentos, seja para diminuir a pena ou mesmo para aumentar a sanção cominada.
O inciso II do artigo 28 do Código Penal diz também não excluir a imputabilidade penal a embriaguez voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos.
A lei diz ser isento de pena o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
A embriaguez voluntária é aquela prevista no inciso II do artigo 28 do Código Penal e, mesmo sendo completa, permite a punição do agente, em face da teoria da actio libera in causa, segundo a qual os casos em que alguém, no estado de não-imputabilidade, é causador, por ação ou omissão, de algum resultado punível, tendo se colocado naquele estado, ou propositadamente, com a intenção de produzir o efeito lesivo, ou sem essa intenção, mas prevendo a possibilidade do resultado, ou, ainda, quando a podia ou devia prever.
A embriaguez voluntária se divide em voluntária em sentido estrito e culposa. No primeiro caso, o agente, volitivamente, faz ingestão de bebidas alcoólicas com a finalidade de se embriagar. Culposa é aquela espécie de embriaguez em que o agente não faz a ingestão de bebidas alcoólicas querendo embriagar-se, mas, deixando de observar o seu dever de cuidado, ingere quantidade suficiente que o coloca em estado de embriaguez.
Nas duas espécies de embriaguez voluntária, o agente será responsabilizado pelos seus atos, mesmo que, ao tempo da ação ou omissão, seja inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Sua ação, como diz a teoria da actio libera in causa, foi livre na causa, ou seja, no ato de ingerir bebida alcoólica,  assim, poderá o agente ser responsabilizado criminalmente pelo resultado.
Pela definição de actio libera in causa, o agente pode embriagar-se preordenadamente, com a finalidade de praticar uma infração penal, oportunidade em que, se vier a cometê-la, o resultado lhe será imputado a título de dolo, sendo, ainda, agravada a pena em razão da existência da circunstância prevista no artigo 61, inciso II, alínea “l” do Código Penal, ou, querendo embriagar-se, mas sem a finalidade de praticar qualquer infração penal, se o agente vier a causar um resultado lesivo, este lhe poderá ser atribuído, geralmente, a título de culpa.
A embriaguez involuntária pode ser proveniente de caso fortuito ou força maior.
Para que seja afastada a culpabilidade do agente, isentando-o de pena, é preciso, conforme determina o artigo 28, inciso II, § 1º do Código Penal, que a involuntária e completa embriaguez do agente seja conjugada com sua total incapacidade de entender o caráter ilícito do fato ou  determinar-se de acordo com esse entendimento.
Também é isento de penal o agente, nos termos do artigo 45 da Lei de Entorpecentes, sob o efeito de droga, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, qualquer que tenha sido a infração penal praticada.
A embriaguez involuntária incompleta é prevista no § 2º do inciso II do artigo 28 do Código Penal, segundo o qual a pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, por embriaguez, proveniente de caso fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo da ação ou omissão, plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento.
Embora o inciso II do artigo 28 e seus parágrafos cuidem das diversas espécies de embriaguez, devem ser excluídas delas a chamada embriaguez patológica.
b) potencial consciência da ilicitude do fato
O erro de tipo incidirá sobre os elementos, circunstâncias ou qualquer outro dado que se agregue à figura típica. O erro de proibição, ao contrário, não é estudado no tipo penal, mas, sim, quando da verificação da culpabilidade do agente. Com o erro de proibição procura-se verificar se nas circunstâncias em que se encontrava o agente tinha ele condições de compreender o fato que praticava era ilícito.
A diferença fundamental entre consciência real e consciência potencial sobre a ilicitude do fato é que, naquela, o agente deve, efetivamente, saber que a conduta que pratica é ilícita; na consciência potencial, basta a possibilidade que o agente tinha, no caso concreto, de alcançar esse conhecimento. Daí o conceito de consciência da ilicitude como a capacidade de o agente de uma conduta proibida, na atuação concreta, apreender a ilicitude de seu comportamento.
O erro sobre a ilicitude do fato, ou erro de proibição, pode ser: a) direto; b) indireto; c) mandamental.
Diz-se direto quando o agente vem a recair sobre o conteúdo proibitivo de uma norma penal. O agente, por erro inevitável, realiza uma conduta proibida, por desconhecer a norma proibitiva,  por conhece-la mal, ou por não compreender o seu verdadeiro âmbito de incidência.
Erro de proibição indireto é a suposição errônea de uma causa de justificação, se o autor erra sobre a existência ou os limites da proposição permissiva (erro de permissão).
Para a teoria limitada da culpabilidade, se o erro do agente recair sobre uma situação fática que, se existisse, tornaria a ação legítima, será considerado erro de tipo; agora, se incidir sobre a existência ou limites de uma causa de justificação, o erro será de proibição. 
A teoria extremada da culpabilidade não faz distinção entre o erro que recai sobre uma situação de fato, sobre a existência ou limites de uma causa de justificação, pois que para ela todos são considerados erros de proibição.
Para Jescheck, o erro incidente sobre uma situação de fato, que ocorre nas discriminantes putativas, não pode ser considerado erro de tipo e tampouco erro de proibição. Para o autor, tal hipótese caracteriza-se como um erro sui generis.
Erro mandamental é aquele que incide sobre o mandamento contido nos crimes omissivos, sejam eles próprios ou impróprios. É o erro que recai sobre uma norma mandamental,  impositiva, que manda fazer e que está implícita, evidentemente, em todos os crimes omissivos.
Nos delitos omissivos deve-se distinguir o erro que recai sobre a situação objetiva da que se deriva a posição do garantidor, cujo desconhecimento dará lugar a um erro de tipo; o desconhecimento do dever de cuidado oriundo dessa posição deve dar lugar ao erro de proibição.
Tal como acontece com o erro de tipo, o erro de proibição pode ser evitável (vencível, inescusável) ou inevitável (invencível, escusável). Suas consequências, contudo, são diferentes. A finalidade precípua do erro de tipo é afastar o dolo da conduta do agente, seja ele escusável ou inescusável. Entretanto, se o erro de tipo for considerado escusável, eliminará o dolo e a culpa; se inescusável, ainda continuará a afastar a conduta dolosa, mas permitirá a punição do agente por um crime culposo, se previsto em lei.
Se evitável o erro, o fato praticado será típico, ilícito e culpável. Contudo, como laborou em erro, a reprovabilidade sobre o injusto penal por ele realizado será menor, razão pela qual sua pena será diminuída de um sexto a um terço.
c) exigibilidade de conduta diversa
Seu conceito é muito amplo e abrange até mesmo as duas situações anteriormente colocadas – imputabilidade e potencial consciência da ilicitude do fato – que têm como finalidade afastar a culpabilidade do agente. Se o autor era inimputável, pois que, ao tempo da ação ou omissão, era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento, não se lhe podia exigir uma conduta conforme o Direito; da mesma forma aquele que atua não possuindo a necessária consciência sobre a ilicitude do fato. Todas as causas dirimentes da culpabilidade desembocarão na chamada inexigibilidade de conduta diversa, haja vista que, nas condições em que se encontrava o agente, não se podia exigir dele outro comportamento.
O Código Penal prevê algumas causas legais que excluem a culpabilidade e, dentre elas, estão: coação irresistível, obediência hierárquica e a possibilidade de aborto quando a gravidez é resultante de estupro. Ressalte-se que mencionada coação é aquela de natureza moral (vis compulsiva). Isso porque a coação física afasta a própria conduta do agente, por ausência de dolo ou culpa. Nos casos de coação resistível, embora o fato seja considerado típico, ilícito e culpável, poderá ao agente ser aplicada a circunstância atenuante prevista no artigo 65, inciso III, alínea “c”, primeira parte do Código Penal.
A estrita obediência a ordem não manifestamente ilegal de superior hierárquico afasta a culpabilidade do agente em virtude de não lhe ser exigível, nessas condições, um comportamento conforme o Direito. Para que possa ser beneficiado com essa causa legal de exclusão da culpabilidade, é preciso a presença dos requisitos: ordem proferida por superior hierárquico; ordem não manifestamente ilegal; comprimento da ordem adstrito a seus limites. Se o crime for cometido em razão da ordem de autoridade, tem aplicação a circunstância atenuante prevista no artigo 65, inciso III, alínea “c”, segunda parte do Código Penal.
Causas supralegais de exclusão da culpabilidade são aquelas que, embora não estejam previstas expressamente em algum texto legal, são aplicadas em virtude dos princípios informadores do ordenamento jurídico. Nossa legislação penal não proíbe a utilização do argumento da inexigibilidade de conduta diversa como causa supralegal de exclusão da culpabilidade.
Existem situações que fazem com que algumas pessoas se recusem, terminantemente, a cumprir as determinações legais em virtude de sua consciência. Quando não há alternativa para a objeção de consciência, o agente deverá, mesmo aviltando seus princípios, cumprir a lei? Rogério Greco entende que, em muitas situações, atendendo a um critério de razoabilidade, poderá ser arguida a inexigibilidade de conduta diversa com a finalidade de afastar a infração penal atribuída ao agente.
Nos julgamentos realizados pelo Tribunal do Júri era observada resistência no que dizia respeito à aceitação da tese da inexigibilidade de conduta diversa como causa supralegal da exclusão da culpabilidade em virtude da redação constante do revogado artigo 484, inciso III do Código de Processo Penal que, supostamente, permitia a formulação de quesitos se o réu apresentasse, na sua defesa, ou alegasse, nos debates, qualquer fato ou circunstância que, por lei, o isentasse de pena, ou, ainda, desclassificasse sua conduta. Hoje, a discussão resta superada, pois a nova redação dos artigos 482 e 483 do Código de Processo Penal[1] permite concluir pela sua total aplicação.
Dessa forma, tal como ocorre com a legítima defesa, onde não existe mais a possibilidade de desdobrar os quesitos, analisando cada um dos seus elementos (injusta agressão, uso moderado dos meios necessários, atualidade ou eminência, defesa própria ou de terceiro), as partes discutirão se o agente, na situação em que se encontrava, tinha possibilidade de agir de forma diferente. Esse fato, levado ao conhecimento do Conselho de Sentença, fará com que o jurado decida se absolve ou condena o acusado.
- co-culpabilidade
A teoria da co-culpabilidade ingressa no mundo do Direito Penal para apontar e evidenciar a parcela de responsabilidade que deve ser atribuída à sociedade quando da prática de determinadas infrações penais.
Na prática, como é possível levar a efeito essa divisão de responsabilidade entre a sociedade e aquele que, em virtude de sua situação de exclusão social, praticou determinada infração penal? Não se pode, obviamente, pedir a cada membro da sociedade que cumpra um pouco da pena a ser aplicada. Assim, a doutrina leciona que há duas opções: a primeira, dependendo da situação de exclusão social que se encontre a pessoa que, em tese, praticou um dato definido como crime, será a sua absolvição; a segunda, a aplicação do artigo 66 do Código Penal[2].

Fonte: Curso de Direito Penal – Parte Geral. Rogério Grecco.                 


[1]  Art. 482.  O Conselho de Sentença será questionado sobre matéria de fato e se o acusado deve ser absolvido. 
        Parágrafo único.  Os quesitos serão redigidos em proposições afirmativas, simples e distintas, de modo que cada um deles possa ser respondido com suficiente clareza e necessária precisão. Na sua elaboração, o presidente levará em conta os termos da pronúncia ou das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação, do interrogatório e das alegações das partes.
        Art. 483.  Os quesitos serão formulados na seguinte ordem, indagando sobre: 
        I – a materialidade do fato; 
        II – a autoria ou participação;
        III – se o acusado deve ser absolvido;
        IV – se existe causa de diminuição de pena alegada pela defesa;
        V – se existe circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena reconhecidas na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação.
        § 1o  A resposta negativa, de mais de 3 (três) jurados, a qualquer dos quesitos referidos nos incisos I e II do caput deste artigo encerra a votação e implica a absolvição do acusado.
        § 2o  Respondidos afirmativamente por mais de 3 (três) jurados os quesitos relativos aos incisos I e II do caput deste artigo será formulado quesito com a seguinte redação:
        O jurado absolve o acusado?
        § 3o  Decidindo os jurados pela condenação, o julgamento prossegue, devendo ser formulados quesitos sobre:
        I – causa de diminuição de pena alegada pela defesa;
        II – circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena, reconhecidas na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação.
        § 4o  Sustentada a desclassificação da infração para outra de competência do juiz singular, será formulado quesito a respeito, para ser respondido após o 2o (segundo) ou 3o (terceiro) quesito, conforme o caso.
        § 5o  Sustentada a tese de ocorrência do crime na sua forma tentada ou havendo divergência sobre a tipificação do delito, sendo este da competência do Tribunal do Júri, o juiz formulará quesito acerca destas questões, para ser respondido após o segundo quesito.
        § 6o  Havendo mais de um crime ou mais de um acusado, os quesitos serão formulados em séries distintas.
[2]  Art. 66 - A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei.