quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Questões Incidentais e Processos Incidentes Processo Penal

O comum entre os processos incidentes é o seu processamento em apenso aos autos da ação penal, reclamando, em regra (a exceção fica por conta do julgamento de eventuais embargos ao seqüestro, que deverá ser posterior ao julgamento da ação penal), pronunciamento prévio do Juízo. Tais incidentes, em geral, também não suspendem o curso da ação penal. Já as questões prejudiciais de que cuidam os artigos 92 e seguintes do Código de Processo Penal não têm processamento em apartado à ação penal; aliás, nem sequer são da competência do Juízo criminal.
Trata-se de matéria cuja solução é prejudicial ao julgamento da ação penal, no sentido de atuarem como pressupostos (fundamento de origem) da própria definição da existência do crime. Em uma palavra, integram, como elementar, o tipo penal imputado ao réu. É bem verdade que há também questões incidentais no Juízo criminal que igualmente reclamam solução prévia, para a própria configuração do crime. São as chamadas questões prejudiciais homogêneas, de que é exemplo mais eloqüente a apreciação do crime de receptação, cujo tipo penal apresenta como elementar o fato de ser produto de crime a coisa ali mencionada.
Entretanto, embora prejudicial, nada impede que o Juiz da causa prejudicada resolva como lhe parecer de direito uma questão, mesmo quando não for territorialmente competente para o julgamento de ambas as causas. É bem verdade que essa possibilidade põe em risco o princípio da unidade da jurisdição, a partir de eventuais soluções distintas para um único mesmo fato. Ocorre, porém, que, tratando-se de matéria que se insere na competência jurisdicional do Juiz, o risco pode ser minimizado pela aplicação das regras da conexão, sobretudo aquela que cuida da conexão instrumental ou probatória (artigo 76, inciso III do CPP). No que respeita, entretanto, às questões propriamente ditas, isto é, aquelas previstas nos artigos 92 e 93 do Código de Processo Penal, também chamadas de questões heterogêneas, a respectiva solução judicial, como regra, não é da competência do Juiz criminal, e sim da jurisdição cível. Daí porque inevitável o recurso às regras da conexão, por exemplo. As questões prejudiciais – objeto de uma relação jurídica de natureza civil – podem ser obrigatórias ou facultativas.
Na primeira hipótese, serão obrigatórias no sentido de afastarem absoluta e completamente a competência da instância criminal, devendo ser resolvidas unicamente na jurisdição cível. Isso ocorre quando a decisão sobre a existência da infração depender da solução de controvérsia, que o Juiz repute séria e fundada, sobre o estado civil das pessoas (artigo 92 do CPP). Assim, o Juiz de ofício ou a requerimento das partes suspende o processo, até solução final e definitiva da questão no Juízo cível, devendo o Ministério Público (se pública a respectiva ação) promover a ação civil relativa à questão prejudicial, ou nela prosseguir, quando já iniciada. O prazo prescricional estará suspenso enquanto não resolvida a questão no Juízo cível, nos termos do artigo 116, inciso I do Código Penal, devendo o Juiz determinar a produção de provas reputadas urgentes. Diferentemente, a questão prejudicial será facultativa, ou seja, a depender do juízo de conveniência e oportunidade do Juiz da causa penal, quando a existência da infração penal depender de decisão relativa ao estado civil das pessoas (artigo 93 do CPP).

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Ineficácia dos Negócios Jurídicos

A ineficácia, no sentido geral, é declaração legal de que os negócios jurídicos não se amoldam aos efeitos que ordinariamente produziram. Sem dúvida, a ineficácia, por qualquer de suas formas, tem sentido de pena, punição pelo fato de os agentes terem transgredido os requisitos legais. Essa pena ora tem o interesse público a respaldá-la, como nos atos ou negócios inexistentes e nulos, ora simples interesse privado, em que a lei vê o defeito de menor gravidade, como nos atos ou negócios anuláveis.
O vocábulo ineficácia é empregado para todos os casos em que o negócio jurídico se torna passível de não produzir os efeitos regulares. Quando o negócio jurídico é declarado judicialmente defeituoso, torna-se inválido. Nesse sentido, há que tomar o termo invalidade.
A função da nulidade é tornar sem efeito o ato ou o negócio jurídico. A idéia é fazê-lo desaparecer como se nunca houvesse existido. Os efeitos que lhe seriam próprios não podem ocorrer. Trata-se, portanto, de vício que impede o ato de ter existência legal e produzir efeito, em razão de não ter sido obedecido qualquer requisito formal.
Nos casos de nulidade absoluta, em contraposição à nulidade relativa, que é a anulabilidade, existe interesse social, além de interesse individual, para que o ato não ganhe força.
É nulo o negócio jurídico quando: celebrado por pessoa absolutamente incapaz; for ilícito, impossível ou indeterminável seu objeto; o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito; não revestir a forma prescrita em lei; for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; tiver por objetivo fraudar lei imperativa; a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.
Quando um só dos partícipes estiver ciente da ilicitude, não há como nulificar o negócio sob pena de constante instabilidade no mundo jurídico. A ciência de ambas as partes quanto ao motivo determinante é matéria de prova, nem sempre fácil, por sinal.
A nulidade repousa sempre em causas de ordem pública, enquanto a anulabilidade tem em vista mais acentuadamente o interesse privado.
Em geral, prova-se o ato nulo de forma objetiva, pelo próprio instrumento ou por prova literal. Poderá ocorrer, porém, com menos freqüência, que a nulidade necessite ser provada, caso seja contestada ou posta em dúvida, como é o caso de ato praticado pelo alienado mental, antes de sua interdição; da hipótese do motivo ilícito bilateral ou da fraude mencionadas. Tais circunstâncias deverão ser provadas para que se constate a nulidade.
A nulidade é penalidade que importa em deixar de existir qualquer efeito do ato, desde o momento de sua formação (ex tunc). A sentença que decreta a nulidade retroage, pois, à data do nascimento do ato viciado.
A regra “o que é nulo não pode produzir qualquer efeito” (quod nullum este nullum effectum producit) deve ser entendida com o devido temperamento. Na maioria das vezes, embora o ato seja tido como nulo pela lei, dele decorrem efeitos de ordem material.
O negócio é juridicamente nulo, mas o ordenamento não pode deixar de levar em conta efeitos materiais produzidos por esse ato. Isso é verdadeiro tanto em relação aos atos nulos como em relação aos atos anuláveis. As partes contratantes devem ser reconduzidas ao estado anterior. Nem sempre, fisicamente, isso será possível, assim serão indenizadas com o equivalente.
Quanto os efeitos materiais do ato não podem ser extirpados, a lei determina que seja feita recomposição em dinheiro, único substituto possível nessas premissas.

sábado, 27 de agosto de 2011

Petição Inicial

Como regra, no direito brasileiro, a demanda deve vir de forma escrita, admitindo-se, excepcionalmente, a demanda oral.
Como a demanda tem a função de bitolar a atividade jurisdicional, que não pode extrapolar os seus limites (decidindo além, aquém ou fora do que foi pedido), costuma-se dizer que a petição inicial é um projeto de sentença: contém tudo aquilo que o demandante almeja ser o conteúdo da decisão que vier a acolher o seu pedido.
Os requisitos formais da petição inicial estão previstos nos artigos 282 e 283 do Código de Processo Civil:
- forma escrita;
- firma de advogado legalmente habilitado;
- indicação do Juízo a que é dirigida a demanda;
- qualificação das partes: quando ignorada uma destas circunstâncias, deve o autor declinar esse fato na petição inicial. É possível a demanda contra pessoa incerta, quando se deve proceder a um esboço de identificação;
- o fato e o fundamento jurídico do pedido: formam a denominada causa de pedir. Compõem a causa petendi o fato (causa remota) e o fundamento jurídico (causa próxima). A causa de pedir é o fato ou o conjunto de fatos jurídicos (fatos da vida judicializados pela incidência da hipótese normativa) e a relação jurídica, efeito daquele fato jurídico, trazidos pelo demandante como fundamento do seu pedido. Nosso Código de Processo Civil adotou a teoria da substancialização da causa se pedir, segundo a qual se exige do demandante indicar, na petição inicial, qual o fato jurídico e qual a relação jurídica dele decorrente. Não basta a indicação da relação jurídica, efeito do fato jurídico, sem que se indique qual o fato jurídico que lhe deu causa – teoria da individualização. Com isso, a pluralidade de fatos jurídicos implicará a pluralidade de demandas – hipótese muito comum em ação rescisória, quando o demandante pede a rescisão do julgado com fundamento em mais de uma das hipóteses previstas no artigo 485 do Código de Processo Civil. Não se deve confundir fundamento jurídico (qualificação jurídica, enquadramento jurídico), com fundamentação legal, essa dispensável. O magistrado está limitado, na sua decisão, pelos fatos jurídicos e pelo pedido formulados – não o está, porém, ao dispositivo legal invocado pelo demandante, pois é sua a tarefa de verificar se houve a subsunção do fato à norma (ou seja, verificar se houve incidência). Há quem divida a causa de pedir em ativa e passiva, sendo aquela o fato do direito e essa o fato que impulsiona o interesse de agir. Se o autor reclama a restituição de quantia emprestada, a causa petendi abrange o empréstimo, fato constitutivo do direito alegado (aspecto ativo), e o não pagamento da dívida no vencimento, fato lesivo do direito alegado (aspecto passivo). Observe-se que tanto a causa ativa como a causa passiva são englobadas pela chamada causa de pedir remota: o fato jurídico, que se divide nos aspectos ativo e passivo;
- o pedido;
- valor da causa;
- a indicação dos meios de prova com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados;
- requerimento para citação do réu;
- documentos indispensáveis para a propositura da demanda.
Se a petição inicial estiver irregular, por lhe faltar algum dos seus requisitos, deve o magistrado intimar ao autor para corrigi-la, emendá-la. É o que prescreve o artigo 284 do Código de Processo Civil, que autoriza o Juiz a determinar a emenda da petição inicial, no prazo de 10 dias, intimando-se o advogado do autor.
O indeferimento da petição inicial é decisão judicial que obsta liminarmente o prosseguimento da causa, pois não se admite o processamento da demanda. Não se recomenda, contudo, o indeferimento indiscriminado. A petição inicial somente deve ser indeferida se não houver possibilidade de correção do vício ou, se houver, tiver sido conferida oportunidade para que o autor a emende e este não tenha atendido satisfatoriamente à determinação.
Só há indeferimento liminar antes da ouvida do réu. Após a citação, o Juiz não mais poderá indeferir a petição inicial, de resto já admitida, devendo, se vier a acolher alguma alegação do réu, extinguir o feito por outro motivo. É o indeferimento (na hipótese de invalidade) uma hipótese especial de extinção do processo por falta de um pressuposto processual.
As matérias que dão azo ao indeferimento da petição inicial são todas questões que não se submetem à preclusão, podendo ser conhecidas a qualquer tempo e grau de jurisdição. Com exceção da prescrição, todas são questões de ordem pública. As causas de indeferimento são de duas ordens: a) indeferimento por defeito da petição inicial; b) indeferimento por improcedência prima facie do pedido.
É possível o indeferimento da petição inicial com julgamento do mérito. O magistrado, liminarmente, reconhece a improcedência do pedido e não admite sequer a citação do réu, ato que se revela desnecessário ante a macroscópica impertinência do pedido. É a chamada improcedência prima facie.
O indeferimento da petição inicial pode ocorrer tanto em Juízo singular como em Tribunal. Pode, ainda, ser total ou parcial.
O indeferimento pode ser uma decisão interlocutória, uma decisão monocrática de membro de Tribunal, um acórdão e, também, uma sentença, só se configurando como tal se se tratar de indeferimento total da petição inicial feito por Juízo singular.
Havendo apelação da sentença que indefere a petição inicial (com ou sem exame do mérito), poderá o Juiz, no prazo de 48 horas, rever sua decisão e modificá-la, em juízo de retratação. Desnecessária a citação do réu para acompanhar a apelação. A garantia do contraditório não ficará arranhada, porque nada do que ficara julgado nessa fase processual será vinculativo ao demandado. Poderá, contudo, o réu ingressar no feito, dando-se por citado e oferecendo as contrarrazões da apelação.
São hipóteses de indeferimento:
- inépcia (inaptidão): gira em torno de defeitos vinculativos à causa de pedir e ao pedido; são defeitos que não apenas dificultam, mas impedem o julgamento do mérito. O parágrafo único do artigo 295 do Código de Processo Civil traz as hipóteses de inépcia: ausência de pedido ou de causa de pedir; quando da narração dos fatos não decorrer logicamente o pedido ou quando o pedido for juridicamente impossível; cumulação de pedidos incompatíveis entre si;
- carência de ação: quando há ausência de qualquer condição da ação. Após a contestação, o acolhimento da alegação de carência de ação não implicará indeferimento da petição inicial, mas extinção do processo com base no inciso VI do artigo 267 do Código de Processo Civil;
- verificação da prescrição ou decadência;
- erro de procedimento: a petição inicial somente não será indeferida se puder ser adaptada ao tipo de procedimento legal;
- outras hipóteses: a petição inicial será indeferida quando não atendidas as prescrições dos artigos 39, parágrafo único e 284, ambos do Código de Processo Civil (artigo 295, VI do CPC). Esses artigos determinam a correção de determinados vícios da petição inicial: a) o artigo 39 determina que se indique, na petição inicial, o endereço em que receberá as intimações, sob pena de indeferimento da petição inicial, se não for suprida a omissão no prazo de 48 horas; o artigo 284 é regra geral que autoriza o magistrado a determinar a emenda da petição inicial, para correção de vícios sanáveis, no prazo de 10 dias, também sob pena de indeferimento.
O pedido é o núcleo da petição inicial, a providência que se pede ao Poder Judiciário, a pretensão material deduzida em Juízo (e que, portanto, vira pretensão processual), a conseqüência jurídica (eficácia) que se pretende ver implementada através da atividade jurisdicional.
O pedido baliza a prestação jurisdicional, que não poderá ser extra, ultra, infra ou citra petita, conforme prescreve o princípio da congruência. Serve o pedido também como elemento de identificação da demanda, para fins de verificação da ocorrência de conexão, litispendência ou coisa julgada. O pedido é, finalmente, o parâmetro para identificação do valor da causa.
Pedido imediato seria a providência jurisdicional que se pretende: a condenação, a expedição de ordem, a constituição de nova situação jurídica, a tomada de providências executivas, a declaração, etc. O pedido mediato é o bem da vida, o resultado prático, que o demandante espera conseguir com a tomada daquela providência. Essa distinção tem algum relevo.
O pedido imediato será sempre determinado; já o mediato pode ser relativamente indeterminado (pedido genérico – artigo 286 e incisos do CPC).
Em relação ao pedido mediato, aplica-se o princípio da congruência, que, de resto, decorre da garantia constitucional do contraditório; o magistrado não pode alterar o bem da vida pretendido pelo demandante. Essa é a regra.
No que diz respeito ao pedido imediato – providência jurisdicional – deve ser temperada a exigência, por força do artigo 84 do Código de Defesa do Consumidor e 461 do Código de Processo Civil, que autorizam o magistrado a tomar providências de ofício, de modo a alcançar com mais facilidade e eficiência o resultado prático almejado.
Pedido certo é pedido expresso. Pedido determinado é aquele delimitado e relação à quantidade e à qualidade.
Há cumulação de pedidos quando se formulam vários pedidos, pretendendo-se o acolhimento simultâneo de todos eles. O traço comum das ações cumuladas consiste na aptidão para cada ação de se incluir como objeto de uma relação processual independente.
Ocorre cumulação simples quando as pretensões não têm entre si relação de procedência lógica (pedido prejudicial ou preliminar), podendo ser analisadas uma independentemente da outra. Não há necessidade de exame prévio de um dos pedidos, que são autônomos: podem ser acolhidos total ou parcialmente, ou rejeitados, sem que se perquira o resultado do julgamento do outro.
Dá-se cumulação sucessiva quando os exames dos pedidos guardam entre si um vínculo de precedência lógica: o acolhimento de um pedido pressupõe o acolhimento do anterior. Essa dependência lógica pode ocorrer de duas formas: a) o primeiro pedido é prejudicial ao segundo: o não acolhimento do primeiro pedido implicará a rejeição (e, portanto, julgamento) do segundo; b) o primeiro pedido é preliminar ao segundo: o não-acolhimento do primeiro implicará a impossibilidade de exame do segundo (que não será julgado). O acolhimento do primeiro pedido, em qualquer caso, não implica necessariamente o acolhimento do segundo pedido.
Cogita-se também da chamada cumulação imprópria de pedidos. Cuida-se da formulação de vários pedidos ao mesmo tempo, de modo que apenas um deles seja atendido: chama-se, por isso, de cumulação imprópria o fenômeno, exatamente porque tem o autor ciência de que apenas um dos pedidos formulados poderá ser satisfeito.
Na cumulação eventual, também chamada de pedidos subsidiários, pedidos sucessivos ou cumulação subsidiária. Trata-se da aplicação do princípio da eventualidade, segundo o qual a formulação das pretensões e exceções deve ser feita no momento específico da postulação. O autor estabelece uma hierarquia/preferência entre os pedidos formulados: o segundo será analisado se o primeiro for rejeitado ou não puder ser examinado (falta de um pressuposto de exame do mérito); o terceiro só será atendido se o segundo e o primeiro não puderem sê-lo etc. O magistrado está condicionado à ordem de apresentação dos pedidos, não podendo passar ao exame do posterior se não examinar e rejeitar o anterior. Nem mesmo se houver reconhecimento pelo réu da procedência do pedido subsidiário.
A cumulação de pedidos incompatíveis entre si é caso de inépcia da petição inicial.
Acolhido o pedido principal, estará o magistrado dispensado de examinar o pedido subsidiário, que não ficará acobertado pela coisa julgada, exatamente por não ter sido examinado.
Poderá o autor recorrer da parte da decisão que rejeitar o pedido principal, mesmo que logre êxito no pedido subsidiário. Se a sentença reconhece a procedência do pedido principal, o Tribunal não poderá, no julgamento da apelação do réu, dando a ela provimento, adentrar no exame do pedido subsidiário, porquanto somente o capítulo da decisão relacionado com o pedido principal é que foi devolvido pelo órgão ad quem.
A sucumbência total do autor, quando formula pedido sucessivo, só existirá se todos os seus pedidos forem rejeitados. Acolhido o pedido subsidiário, não haveria porque falar-se em sucumbência parcial: cabe relembrar que, em demanda formulada com cumulação eventual, não é possível o acolhimento de mais de um pedido. Acolhido totalmente um dos pedidos, o autor é vencedor exclusivo. Outra solução para o caso de acolhimento do pedido subsidiário, em razão da rejeição do pedido principal, é entender que houve pequena sucumbência do autor.
A cumulação imprópria sucessiva diferencia-se a eventual porque neste o autor demonstra preferência em relação da um dos pedidos. O valor da causa será o do pedido que tiver maior valor.
Acolhido um dos pedidos alternativos, não terá o autor interesse para recurso com o objetivo do acolhimento do outro. Aplicam-se, por analogia, à demanda recursal, as técnicas de postulação inicial, como a cumulação de pedidos e os pedidos subsidiários.
A cumulação de pedidos por ser inicial, quando veiculada no ato que originalmente contém a demanda (petição inicial da demanda ou reconvencional) ou ulterior, quando a parte agrega novo pedido à sua demanda após a postulação inicial, já no curso do processo. É cumulação ulterior o aditamento permitido da petição inicial. Outro exemplo de cumulação ulterior é o ajuizamento pelo autor de ação declaratória incidental, mesmo aquela que objetiva o reconhecimento da falsidade de documento.
Fala-se em cumulação homogênea quando os pedidos forem formulados pela mesma parte, e cumulação heterogênea ou contrastante, quando os pedidos forem formulados por partes distintas, como é o caso da cumulação pela reconvenção ou denunciação da lide promovida pelo réu. Nesta linha, cumpre advertir, não se aplica à cumulação heterogênea o requisito da compatibilidade dos pedidos.
São requisitos para cumulação:
- competência: somente será possível a cumulação se o Juiz tiver competência absoluta para conhecer de todos os pedidos formulados. Não deve o magistrado indeferir totalmente a petição inicial, se ocorrer cumulação de pedido que fuja sua competência; deve admitir o processamento do pedido que lhe é pertinente, rejeitando o prosseguimento daquele estranho à sua parcela de jurisdição. Se a cumulação envolver pedido para cujo processamento o Juízo não tenha competência relativa, o desmembramento da petição inicial dependerá da propositura da exceção de incompetência do réu. No entanto, se entre os pedidos houver conexão, é possível a cumulação, mesmo que o Juízo seja relativamente incompetente para processar/julgar um deles, em razão do efeito modificativo da competência que decorre da conexão. Não poderá o réu opor-se a tal cumulação;
- compatibilidade de pedidos: se for possível a cumulação de pedidos incompatíveis, deve o demandante valer-se da técnica da cumulação imprópria (eventual ou alternativa), que dispensa a compatibilidade dos pedidos, exatamente porque se espera o acolhimento de apenas um deles;
- identidade do procedimento ou conversibilidade no rito ordinário.
Salvo os casos em que se admite pedido implícito, incumbe ao autor formular na petição inicial todos os pedidos que puder contra o réu. Poderá o autor, contudo, aditar a petição inicial antes da citação, desde que arque com as custas do aditamento. Note-se que há um descompasso, injustificado, com a norma que permite a alteração do pedido, que pode ser feita depois da citação, com o consentimento do réu.
São hipóteses de redução do pedido: a) desistência parcial; b) renúncia parcial ao direito postulado; c) transição parcial na pendência do processo; d) convenção de arbitragem relativa a parte do objeto do litígio, na pendência do processo; e) interposição, pelo autor, de recurso parcial contra a sentença de mérito desfavorável.
É direito processual de o autor promover a alteração (substituição) dos elementos objetivos da demanda (pedido e causa de pedir) antes da citação do réu. Após a citação, o autor somente poderá fazê-lo com consentimento do demandado, ainda que revel, que terá novo prazo de resposta, pois a demanda terá sido alterada. Trata-se de verdade negócio jurídico processual. A negativa do réu deve ser expressa, pois o silêncio, após a intimação da proposta de mudança, poderá ser interpretado como concordância tácita, operando-se a preclusão. Há entendimento segundo o qual a mudança objetiva ex officio pelo magistrado deve ser impugnada, sob pena de operar-se a preclusão.
Após o saneamento, é vedada qualquer alteração objetiva promovida pelo autor, mesmo com o consentimento do réu. Em razão disso, não se pode alterar objetivamente o processo na fase recursal, até mesmo para que não haja supressão de instância. A única alteração objetiva do processo possível após o saneamento é a que ocorre em razão da oposição interventiva (artigo 59 do CPC), que, além de promovida por terceiro, deverá ser feita até o início da audiência de instrução e julgamento. Observadas estas regras, é possível a alteração do objeto imediato ou mediato do pedido. Eventuais correções de erros materiais da demanda podem ser feitas a qualquer tempo.
A regra do artigo 475-N, inciso III do Código de Processo Civil, segundo a qual é possível a inclusão, na conciliação judicial, de objeto estranho ao processo, enfraqueceu a preclusão determinada neste artigo, pois é inegável que, agora, é possível a inclusão consensual de novo pedido/causa de pedir – antes ou após a citação, pouco importa o momento (artigo 125, IV do CPC) – ainda que apenas para ser objeto de um acordo judicial.
Pedido implícito e aquele que, embora não explicitado na demanda, compõe o objeto do processo (mérito) por força de lei; mesmo que a parte não peça, deve o magistrado examiná-lo e decidi-lo. É temperamento da regra de que o pedido deve ser certo (expresso) e que sua interpretação deve ser restritiva (artigo 293 do CPC). São exemplos de pedidos implícitos: juros legais; ressarcimento das despesas processuais e honorários advocatícios; correção monetária; pedido relativo a obrigações periódicas, pois o autor está desobrigado a pedir as prestações vincendas: o magistrado deve incluir, na decisão, as prestações vincendas e não pagas. Importa frisar que os juros convencionais ou compensatórios não prescindem do pedido expresso do autor, não constituindo pedido implícito.
Permite a lei, em alguns casos, a formulação de pedido genérico. Determinado quanto ao gênero, o pedido pode ser genérico em relação à quantidade. No tocante ao an debeatur será determinado; em relação ao quantum debeatur, será indeterminado.
Admite-se o pedido genérico nas ações universais, se não puder o autor individuar na petição os bens demandados. É aceito também nas ações indenizatórias em razão de ato ou fato ilícito, quando não for possível determinar, de modo definitivo as conseqüências danosas (muito embora o autor não precise quantificar o dano, deverá especificar o prejuízo sofrido).
O autor deve quantificar o valor da indenização na petição inicial, pois o pedido nestas demandas deve ser certo e determinado, delimitando o autor quanto pretende receber como ressarcimento pelos prejuízos morais que sofreu. A função do magistrado é julgar se o montante requerido pelo autor é ou não devido; não lhe cabe, sem uma provocação do demandante, dizer quanto deve ser o montante. Ademais, se o autor pedir que o magistrado determine o valor da indenização, não poderá recorrer da decisão, pois o pedido teria sido acolhido integralmente, não havendo como se cogitar de interesse recursal.
Somente é possível a iliquidez do pedido, nestas hipóteses, se o ato causador do dano puder repercutir, ainda, no futuro, gerando outros danos; aplicar-se-ia então o inciso II do artigo 286 do Código de Processo Civil. Fora desta hipótese, incabível a formulação de pedido ilíquido.
Permite-se, ainda, pedido genérico quando a condenação depender de ato a ser praticado pelo réu, como na hipótese da ação de prestação de contas cumulada com o pagamento de saldo devedor.
Pedido alternativo é aquele que reclama prestações disjuntivas. Trata-se do tipo de pedido classificado a partir de dada relação de direito substancial, que permite a satisfação do direito por prestações autônomas e excludentes. O pedido será alternativo quando veicular pretensão oriunda de obrigação alternativa, facultativa ou com faculdade de substituição.
Não se trata de cumulação de pedidos (nem da chamada cumulação alternativa): somente um pedido é feito, a forma de satisfação desse pedido é que é disjuntiva.
Se a escolha couber ao autor, não haverá pedido alternativo: será fixo, pois o autor ao formulá-lo fez a sua escolha. Poderá o autor reservar-se para escolher na fase de execução (mesmo em se tratando de obrigação de fazer, não fazer ou dar, cujo cumprimento da respectiva sentença dispensa processo autônomo de execução), formulando pedido alternativo.
Se o réu for revel, tendo o autor formulado pedido fixo, quando a escolha caberia ao demandado entende-se que a revelia não descaracteriza a natureza da obrigação. Ela conduz à admissibilidade dos fatos, não à constituição de fatos jurídicos novos, nem à descaracterização do fato jurídico título da demanda. Consequentemente, ao revel deve o Juiz condenar, deferindo-lhe o direito de escolha, se o autor formulou pedido fixo quando deveria tê-lo posto como alternativo.
O artigo 287 do Código de Processo Civil permite que o autor peça ao magistrado que comine multa ao réu para o caso de descumprimento de decisão, provisória ou definitiva, que lhe imponha um fazer, um não-fazer ou um dar coisa distinta de dinheiro.
A tutela jurisdicional das obrigações de fazer, não fazer e a de entregar coisa não mais efetiva por sentença condenatória, que pressupõe processo de execução posterior. Atualmente, é absolutamente atécnico falar-se, por exemplo, de “sentença condenatória de obrigação de fazer”, ou “de não fazer”, ou “de entregar coisa” (distinta de dinheiro), pois tais obrigações são efetivadas ou por provimentos mandamentais ou por provimentos executivos.
Todo direito a uma prestação pode ser tutelado por técnicas de cognição com força executiva: mandamental, que pressupõe colaboração do sujeito passivo, após coerção indireta do Estado-Juiz, e executiva em sentido lato, que dispensa o auxílio do obrigado, valendo-se o Poder Judiciário de medidas de coerção direta.
Havendo ou não pedido de cominação, estará o Juiz autorizado a determinar a pena pecuniária, seja o caso de obrigação de fazer ou não fazer, fungível ou não.
Cuida o artigo 291 do Código de Processo Civil da hipótese em que um dos credores da obrigação indivisível pleiteia em Juízo a sua satisfação. Regula-se a demanda que envolve relação jurídica creditícia em que há pluralidade de credores em torno de objeto indivisível, e somente um ou alguns deles vai a Juízo pedir a efetivação desta obrigação. Esse artigo é o dispositivo processual que regulamenta as disposições de direito material relacionadas com a cobrança judicial de créditos de obrigação indivisível.
Quando há pluralidade de credores de obrigação indivisível, poderá cada um deles exigir a dívida inteira. A pluralidade de credores de obrigação indivisível obriga tratamento igual ao da solidariedade ativa. O direito material, assim, legitima um dos credores a pleitear toda a dívida por inteiro.
Se apenas um dos credores receber a prestação por inteiro, a cada um dos outros assistirá o direito de exigir dele em dinheiro a parte que cabia no total. Aquele credor que não participou do processo, para levantar o seu quinhão, deverá arcar, proporcionalmente, com as despesas processuais de cobrança do crédito (inclusive honorários advocatícios).

Fonte: Curso de Direito Processual Civil. Fredie Didier Júnior.