quarta-feira, 8 de julho de 2009

Atos Administrativos - II - Classificação -

Insta esclarecer que a classificação dos atos administrativos não constitui uma doutrina uniforme, dada a diversidade de critérios que podem ser adotados. Aqui adotamos o ensinamento de Hely Lopes Meirelles, que classifica os atos administrativos quanto a seus destinatários em gerais e individuais; quanto ao seu alcance em internos e externos; quanto ao seu objeto como de império, de gestão e de expediente; quanto ao seu regramento em vinculados e discricionários.

Vejamos cada classe:

- atos administrativos gerais ou regulamentares são aqueles expedidos sem destinatários determinados, com finalidade normativa, alcançando todos os sujeitos que se encontrem na mesma situação de fato abrangida por seus preceitos. São atos de comando abstrato e impessoal, semelhante ao da lei e, por isso mesmo, revogáveis a qualquer tempo pela Administração, mas inatacáveis pela via judicial, a não ser pelo questionamento da constitucionalidade. Somente quando os preceitos abstratos dos atos gerais são convertidos pela Administração em providências concretas e específicas é que se tornam impugnáveis por quem se sentir lesado pela atuação administrativa. Quando de efeitos externos, os atos gerais dependem da publicação no órgão oficial para entrar em vigor e produzir efeitos jurídicos.

- atos administrativos individuais ou especiais são todos aqueles que se dirigem a destinatários certos, criando-lhes uma situação jurídica particular. O mesmo ato pode abranger um ou vários sujeitos, desde que sejam individualizados. Os atos individuais de efeitos internos admitem comunicação direta para o início de sua operatividade, não dependendo, portanto, de publicação como nos de efeitos externos. Os atos administrativos individuais, via de regra, geram direitos subjetivos para seus destinatários, como também lhes criam encargos administrativos pessoais. Quando geram direitos adquiridos tornam-se irrevogáveis (Enunciado da Súmula 473 do STF). Nos demais casos podem ser revogados ou modificados conforme exija o interesse público, desde que a Administração indenize o prejudicado, se for o caso. A anulação pode ser tanto pela via administrativa como pela judicial (comum – ação ordinária – ou especial – mandado de segurança e ação popular).

- atos administrativos internos são os destinados a produzir efeitos nas repartições e, por isso mesmo, incidem, normalmente, sobre os órgãos e agentes da Administração que os expediram. São atos de operatividade caseira, que não produzem efeitos em relação a estranhos. Conforme a exigência do serviço público, os atos internos podem ser gerais ou especiais, normativos, ordinatórios, punitivos e de outras espécies. Não dependem da publicação no órgão oficial, bastando a cientificação direta aos destinatários. Os atos individuais, quando praticados nos seus estritos limites, não geram direitos subjetivos para os destinatários, logo, podem ser revogados ou modificados a qualquer tempo, ao talante da Administração. Por outro lado, sujeitam-se a revisão hierárquica e ao controle do Poder Judiciário.

- atos administrativos externos (mais propriamente de efeitos externos) são todos aqueles que alcançam os administrados e, em certos casos, os próprios servidores, provendo sobre direitos, obrigações, negócios ou conduta perante a Administração. Tais atos só entram em vigor depois da publicação no órgão oficial.

- atos de império ou de autoridade são todos aqueles que a Administração pratica usando de sua supremacia sobre o administrado ou servidor e lhes impõe atendimento obrigatório. Tais atos podem ser gerais ou individuais, de efeitos internos ou externos, mas sempre serão unilaterais, expressando a vontade onipotente do Estado e seu poder de coerção. São, normalmente, atos revogáveis a critério da Administração que os expediu.

- atos de gestão são os que a Administração pratica sem usar de sua supremacia sobre os destinatários. Não exigem coerção, são atos de administração sobre bens e serviços públicos, bem como negociais com particulares. Nem sempre são atos administrativos típicos, principalmente quando bilaterais, de alienação, oneração ou aquisição de bens, que se igualam aos de Direito Privado, apenas antecedidos de formalidades administrativas para sua realização. Os atos de gestão são vinculantes e geram direitos subjetivos e permanecem imodificáveis pela Administração, salvo quando precários por sua própria natureza.

- atos de expediente são aqueles que se destinam a dar andamento aos processos que tramitam pelas repartições públicas, preparando-os para decisão de mérito a ser proferida pela autoridade competente. Não possuem caráter vinculante e não necessitam de forma especial, podendo ser praticados por servidores subalternos.

- atos vinculados ou regrados são aqueles para os quais a lei estabelece requisitos e condições para sua realização. Neles, as imposições legais absorvem quase por completo a liberdade do administrador, uma vez que a ação fica adstrita aos pressupostos estabelecidos pela norma legal para a validade da atividade administrativa. O não atendimento de qualquer requisito compromete a eficácia do ato praticado, tornando-o passível de anulação. Cabe ressaltar que mesmo nos atos vinculados, o administrador terá de decidir sobre e conveniência e oportunidade de sua prática para atingir o bem comum., contudo, a liberdade do administrador é reduzida e balizada pela lei ou regulamento. É defeso ao administrador desatender a norma que regulamenta a prática do ato. A Administração deve motivar os atos vinculados para evidenciar a conformação de sua prática com as evidências e requisitos legais que constituem pressupostos de sua existência e validade. O Poder Judiciário pode rever os atos vinculados em todos os seus aspectos, porque em qualquer deles poderá revelar-se a infringência dos preceitos legais ou regulamentares que condicionam sua prática.

- atos discricionários são aqueles que a Administração pode praticar com liberdade de escolha de seu conteúdo, de seu destinatário, de sua conveniência, de sua oportunidade e do modo de realização. A rigor, deve-se falar em poder discricionário, uma vez que a liberdade administrativa reside na maneira e nas condições que o administrador reputa mais conveniente para o interesse público. Vale distinguir o ato discricionário do ato arbitrário, haja vista que o último é praticado ao arrepio da lei, enquanto o primeiro, embora conceda ao administrador uma margem de escolha, é previsto pela norma regulamentadora. A discricionariedade administrativa encontra fundamento e justificativa na complexidade e variedade de situações que o Poder Público tem que solucionar a cada passo e para as quais a lei, por mais casuística que fosse, não poderia prever todas as soluções, ou, pelo menos, a mais vantajosa para o caso concreto. A prática de um ato discricionário exige que a lei ou a norma administrativa confira explicita ou implicitamente tal prerrogativa ao administrador e lhe assinale os limites de liberdade e opção na escolha dos critérios postos à sua disposição. O fim legal sempre vem expresso em lei ou é subentendido e a atividade do administrador é colimada ao bem comum. Assim, somente são discricionários os meios e os modos de administrar, nunca os fins a atingir. O ato resultante do poder discricionário da Administração não pode prescindir por certos requisitos, tais como competência legal de quem o pratica, a forma prescrita em lei ou regulamento e o fim indicado no texto legal em que o administrador se apóia. Registre-se que a responsabilização pela prática de atos discricionários não é menor nem maior do que aquela resultante dos atos vinculados.

Os atos administrativos também podem ser classificados seguindo outros critérios. Vejamos:

a) Quanto à formação do ato:

- simples: resulta da formação da manifestação de vontade de um órgão, unipessoal ou colegiado;

- complexo: depende da conjugação de vontades de mais de um órgão administrativo. Distingue-se do procedimento administrativo onde são praticados diversos atos intermediários e autônomos para a obtenção de um ato final e principal. O ato complexo só se aperfeiçoa com a integração da vontade final da Administração e, a partir desse momento, pode ser atacado pela via administrativa ou judicial;

- composto: resulta da vontade de um órgão, mas depende da verificação por parte de outro para se tornar exeqüível, ou seja, depende de ratificação posterior;

b) Quanto ao conteúdo:

- constitutivo: cria uma nova situação jurídica individual para seus destinatários;

- extintivo (desconstitutivo): põe termo a situações jurídicas individuais;

- declaratório: visa preservar direitos, reconhecer situações pré-existes ou possibilitar seu exercício;

- alienativo: opera a transferência de bens ou direitos de um titular a outro. Via de regra, depende de autorização legislativa;

- modificativo: tem por finalidade alterar situações pré-existentes, sem suprimir direitos ou obrigações;

- abdicativo: é aquele pelo qual o titular abre mão de um direito. A particularidade desse ato é seu caráter incondicionável e irretratável. Todo ato abdicativo depende de autorização legislativa, por exceder da conduta ordinária do administrador;

c) Quanto à eficácia:

- válido: é o que provém da autoridade competente e contém todos os requisitos necessários à sua eficácia. O ato válido, porém, pode ainda não ser exeqüível por estar pendente condição suspensiva ou termo não verificado;

- nulo: é o que nasce afetado de vício insanável por ausência ou defeito substancial em seus elementos constitutivos u no procedimento formativo. A nulidade pode ser explícita ou virtual (quando decorre da violação de princípios específicos do direito público). Em qualquer caso, o ato é ilegítimo ou ilegal e não produz efeito válido entre as partes. A nulidade deve ser reconhecida e proclamada pela Administração ou pelo Poder Judiciário, não sendo permitido ao particular negar exeqüibilidade ao ato administrativo. A declaração de nulidade é ex tunc (retroativa), só se admitindo exceção aos terceiros de boa-fé. A Lei 9.784/99 admite a convalidação do ato administrativo. Hely Lopes Meirelles não admite o ato administrativo anulável pela impossibilidade de preponderar o interesse privado sobre o público e não ser admissível a manutenção de atos ilegais. A doutrina admite a conversão ou sanatória de ato administrativo imprestável para um determinado negócio jurídico, mas aproveitável e, outro, para o qual tem os necessários requisitos legais;

- inexistente: é o que apenas tem aparência de manifestação regular da Administração, mas não chega a se aperfeiçoar como ato administrativo (ex. o ato praticado por usurpador de função pública);

d) Quanto à exeqüibilidade:

- perfeito: aquele que reúne todos os elementos necessários para a sua operatividade, apresentado-se apto e disponível para produzir seus regulares efeitos;

- imperfeito: é o que se apresenta incompleto à sua formação ou carente de um ato complementar para se tornar exeqüível;

- pendente: embora perfeito, não produz seus efeitos por não ter sido verificado termo ou condição de que depende sua exeqüibilidade;

- consumado: produziu todos os seus efeitos, tornando-se, por isso, irretratável ou imodificável por lhe faltar objeto;

e) Quanto à sua retratabilidade:

- irrevogável: é aquele que se tornou insuscetível de revogação por ter produzido seus efeitos ou gerado direito subjetivo para o beneficiário ou, ainda, por resultar de coisa julgada administrativa;

- revogável: a Administração somente pode invalidá-lo por motivo de conveniência, oportunidade ou justiça (mérito administrativo), com efeitos ex nunc;

- suspensível: é aquele que a Administração pode fazer cessar os seus efeitos, em determinadas circunstâncias ou por certo tempo, embora mantendo o ato, para oportuna restauração de sua operatividade. Em geral, a suspensão cabe à própria Administração, mas, por exceção, em mandado de segurança e em certas ações é admissível a suspensão pelo Poder Judiciário;

f) Quanto ao modo de execução:

- autoexecutório: traz a possibilidade de execução pela Administração sem a intervenção de ordem judicial;

- não autoexecutório: depende de pronunciamento judicial para produzir os efeitos finais;

g) Quanto ao objetivo visado pela Administração:

- principal: encerra a manifestação de vontade final da Administração, podendo ser simples ou complexo ou, ainda, resultante do procedimento administrativo;

- complementar: é o que aprova ou ratifica o ato principal, para dar-lhe exeqüibilidade. Atua como requisito do ato principal;

- intermediário (preparatório): é o que concorre para a formação de um ato principal e final. Sempre será autônomo em relação aos demais e ao ato final, razão pela qual pode ser impugnado ou invalidado isoladamente, no decorrer do procedimento administrativo;

- ato-condição: é o que se antepõe a outro para permitir sua realização. Destina-se a remover obstáculo à prática de certas atividades públicas ou particulares, para as quais se exige a satisfação prévia de determinados requisitos. O ato-condição é sempre um ato-meio para a realização de um ato-fim;

- de jurisdição: contém decisão sobre matéria controvertida.

h) Quanto aos efeitos:

- constitutivo: é aquele pelo qual a Administração cria, modifica ou suprime um direito do administrado ou seus servidores. Ao mesmo tempo que gera direitos subjetivos para uma parte, constitue obrigação para outra;

- desconstitutivo: é aquele que desfaz uma situação jurídica pré-existente, geralmente vem precedido de um processo administrativo;

- de constatação: é aquele pelo qual a Administração verifica e proclama uma situação fática ou jurídica ocorrente. Tais atos vinculam a Administração que os expede, mas não modificam, por si sós, a situação constatada.

Continua....

Fonte: Direito Administrativo Brasileiro. Hely Lopes Meirelles.

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