sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Princípios Administrativos

Princípios administrativos são os postulados fundamentais que inspiram todo o modo de agir da Administração Pública.

Insta consignar que as normas jurídicas admitem a classificação em duas categorias básicas: os princípios e as regras.

As regras, são operadas de modo disjuntivo, vale dizer, o conflito entre elas é dirimido no plano da validade: aplicáveis ambas a uma mesma situação, uma delas apenas a regulará, atribuindo-se à outra o caráter de nulidade.

Os princípios, ao revés, não se excluem do ordenamento jurídico na hipótese de conflito: dotados que são de determinado valor ou razão, o conflito entre eles admite a adoção do critério da ponderação de valores (ou ponderação de interesses), vale dizer, deverá o intérprete averiguar qual deles, na hipótese em exame, será atribuído grau de preponderância. Não há, porém, nulificação do princípio postergado: este, em outra hipótese e mediante nova ponderação de valores, poderá ser preponderante, afastando-se o outro princípio em conflito.

Os princípios administrativos expressos são aqueles arrolados no artigo 37 da Constituição Federal. Devem ser observados por todas as pessoas administrativas dos entes federativos.

- Princípio da legalidade: certamente é a diretriz básica da conduta dos agentes da Administração. Significa que toda e qualquer atividade administrativa deve ser autorizada por lei. Não o sendo, a atividade é ilícita. É corolário do Estado de Direito, ou seja, aquele Estado que deve respeitar as próprias leis que edita. O princípio da legalidade se reflete na conseqüência de que a própria garantia dos direitos dos indivíduos depende de sua existência. Uma conclusão é inarredável: havendo dissonância entre a conduta e a lei, deverá aquela ser corrigida para eliminar a ilicitude.

- Princípio da impessoalidade: objetiva a igualdade de tratamento que a Administração deve dispensar aos administrados que se encontrem em idêntica situação jurídica. Nesse ponto, representa uma faceta do princípio da isonomia. Por outro lado, para que haja verdadeira impessoalidade, deve a Administração voltar-se exclusivamente para o interesse público. Aqui se reflete a aplicação do principio da finalidade. A função administrativa é baseada na lei e também deverá respeitar a isonomia, sob pena de desvio de finalidade. A Administração há de ser impessoal, sem ter em mira este ou aquele indivíduo de forma especial.

- Princípio da moralidade: impõe que o administrador público não dispense os preceitos éticos que devem estar presentes em sua conduta. Deve não só averiguar os critérios de conveniência, oportunidade e justiça em suas ações, mas também distinguir o que é honesto do que é desonesto. Tal forma de condução também deve estar presente na conduta interna da Administração. Em algumas ocasiões, a imoralidade consistirá na ofensa dieta à lei e aí violará, ipso facto, o princípio da legalidade. Em outras, residirá no tratamento discriminatório, positivo ou negativo, dispensado ao administrado; nesse caso, vulnerado estará também o princípio da impessoalidade, requisito, em última análise, da legalidade da conduta administrativa. Pela ação popular (Lei n.º 4.717/65), qualquer cidadão pode deduzir a pretensão de anular atos do Poder Público contaminados de imoralidade administrativa. Registre-se que a ação civil pública (Lei n.º 7.347/85) possui o mesmo escopo.

- Princípio da publicidade: indica que os atos da Administração devem merecer a mais ampla divulgação possível entre os administrados, e isso porque constitui fundamento do princípio propiciar-lhes a possibilidade de controlar a legitimidade da conduta dos agentes administrativos. Pode se reclamado através de dois instrumentos básicos: o direito de petição e as certidões. Negado o exercício de tais direitos, ou ainda não veiculada a informação, ou veiculada incorretamente, terá o prejudicado os instrumentos constitucionais para garantir a restauração da legalidade o mandado de segurança e o habeas data. É importante que não se deixe de registrar que ao princípio da publicidade devem submeter-se todas as pessoas administrativas, quer as que constituem as próprias pessoas estatais, quer aquelas outras que, mesmo sendo privadas, integram os quadros da Administração Pública, como é o caso das entidades paraestatais.

O direito ao acesso à expedição de certidões está sujeito a restrição, ou até mesmo ao não reconhecimento, quando o interessado age com abuso de direito (ocorre em situações nas quais formula sejam fatos absurdos ou inviáveis) ou reitera pedidos sucessivos de modo irrazoável ou inócuo. Sem embargo da circunstância de que a publicidade dos atos constitui a regra, o sistema jurídico institui algumas exceções, tendo em vista a excepcionalidade da situação e os riscos que eventual divulgação poderia acarretar. O próprio artigo 5º, inciso XXXIII da Constituição Federal resguarda o sigilo de informações quando se revela indispensável à segurança da sociedade e do Estado.

Quanto aos efeitos decorrentes da falta de publicidade, há que se consignar ela se situa no plano da validade ou da eficácia. Anteriormente, a doutrina era mais inflexível, considerado como inválido todo o ato praticado sem publicidade, que seria requisito de validade. Modernamente, tem-se entendido que cada hipótese precisa ser analisada separadamente, inclusive a lei que disponha sobre ela. Assim, a falta de validade não retira a validade do ato, funcionando como fator de eficácia: o ato é válido, mas inidôneo a produzir efeitos jurídicos.

- Princípio da eficiência: o núcleo do princípio é a procura de produtividade e economicidade e, o que é mais importante, a exigência de reduzir desperdício de dinheiro público, impondo-se a execução dos serviços com presteza, perfeição e rendimento funcional. Quanto ao controle do princípio da eficiência, os publicistas entendem que os controles administrativo (de caráter interno e processado pelos próprios órgãos administrativos) e legislativo são reconhecidamente legítimos e indubitáveis à luz dos artigos 70 e 74 da Constituição Federal. O controle judicial, entretanto, sofre limitações e só pode incidir quando se tratar de comprovada ilegalidade. Como tem consagrado corretamente a doutrina, o Poder Judiciário não podem compelir a tomada de decisão que entende ser de melhor grau de eficiência, nem invalidar atos administrativos invocando exclusivamente o princípio da eficiência.

Cumpre ressaltar que a eficiência não se confunde com eficácia nem com efetividade. A eficiência transmite sentido relacionado ao modo pelo qual se processa o desempenho da atividade administrativa, a idéia diz respeito, portanto, à conduta dos agentes. Por outro lado, eficácia tem relação com os meios e instrumentos empregados pelos agentes no exercício de seus misteres na administração. A efetividade é voltada para os resultados obtidos com as ações administrativas, sobreleva nesse aspecto a positividade dos objetivos.

Afora os princípios expressos, a doutrina reconhece outros que, de igual forma, devem orienta a Administração Pública por outras diretrizes, são os denominados princípios reconhecidos.

- Princípio da supremacia do interesse público: as atividades administrativas são desenvolvidas pelo Estado para benefício da coletividade. Mesmo quando age em vista de algum interesse estatal imediato, o fim último de sua atuação deve ser voltado para o interesse público. E se não estiver presente este objetivo, a atuação estará inquinada de desvio de finalidade. Desse modo, não é o indivíduo em si o destinatário da atividade administrativa, mas sim o grupo social num todo – Welfare State – Estado do Bem-Estar.

- Princípio da autotuela: defrontando-se com erros, pode a Administração revê-los para restaurar a situação de regularidade. Não se trata apenas de uma faculdade, mas também de um dever, pois não se pode admitir que, diante de situações irregulares, permaneça inerte e desinteressada. A Administração não precisa ser provocada para o fim de rever seus atos, pode fazê-lo de ofício. A autotutela envolve dois aspectos quanto à atuação administrativa: I) de legalidade, em relação aos quais a Administração, de ofício procede à revisão de atos ilegais; II) de mérito, em que examina atos anteriores quanto à conveniência e oportunidade de sua manutenção ou desfazimento. A Lei n.º 9.784/99, que regulou o processo administrativo, consignou que o direito da Administração de anular atos administrativos que tenham irradiado efeitos favoráveis ao destinatário decai em 5 (cinco) anos.

- Princípio da indisponibilidade: os bens e interesses públicos não pertencem à Administração nem aos seus agentes. Cabe-lhes apenas geri-los, conservá-los e por eles velar em prol da coletividade, esta sim a verdadeira titular dos direitos e interesses públicos. A Administração não tem a livre disposição dos bens e interesses públicos porque atua em nome de terceiros.

- Princípio da continuidade dos serviços públicos: está intimamente ligado ao princípio da eficiência e da supremacia do interesse público. Pretende-se que a coletividade não sofra prejuízos em razão de eventual realce a interesses particulares. É vedado ao particular contratado, dentro de certos limites, opor à Administração a exceção do contrato não cumprido.

- Princípio da segurança jurídica (proteção à confiança): se, de um lado, não se pode relegar o postulado de observância dos atos e condutas aos parâmetros estabelecidos na lei, de outro é preciso evitar que situações jurídicas permaneçam por todo o tempo em nível de instabilidade, o que, evidentemente, provoca incertezas e receios entre os indivíduos. A prescrição e decadência são fatos jurídicos através dos quais a ordem jurídica confere destaque ao princípio da estabilidade das relações jurídicas.

Distingue-se a segurança jurídica da proteção à confiança. Pelo primeiro, confere-se relevo ao aspecto objetivo do conceito, indicando-se a inafastabilidade da estabilização jurídica; pelo segundo, o realace incide sobre o aspecto sujetivo, e neste se sublinha o sentimento do indivíduo em relação aos atos, inclusive e principalmente do Estado, dotados de presunção de legitimidade e aparência de legalidade.

Pela Teoria do Fato Consumado, em certas ocasiões melhor seria convalidar o fato do que suprimi-lo da ordem jurídica, hipótese em que o transtorno seria de tal modo expressivo que chegaria ao extremo de ofender o princípio da estabilidade das relações jurídicas. A tutela da confiança legítima abrange o poder normativo da Administração, e não apenas os atos de natureza concreta por ela produzidos.

- Princípio da razoabilidade: razoável pe aquilo que se situa dentro de limites aceitáveis, ainda que os juízos de valor que provocaram a conduta possam dispor-se de forma pouco diversa. O que é totalmente razoável para uns pode não o ser para outros. Mas, mesmo quando não o seja, é de reconhecer-se que a valoração se situou dentro dos standarts de aceitabilidade. Dentro desse quadro, não pode o Juiz controlar a conduta do administrador sob a mera alegação de que não a entendeu razoável. Não lhe é lícito substituir o juízo de valor do administrador pelo seu próprio, porque a isso se coloca o óbice da separação das funções, que rege as atividades estatais. Poderá, isto sim, até mesmo deverá, controlar os aspectos relativos à legalidade da conduta, ou seja, verificar se estão presentes os requisitos que a lei exige para a validade dos atos administrativos (esse é o sentido que os Tribunais têm emprestado do controle judicial).

O princípio da razoabilidade tem que ser observado pela Administração na medida em que sua conduta se apresente dentro os padrões normais de aceitabilidade. Se atuar fora desses padrões, algum vício estará, sem dúvida, contaminando o comportamento estatal. Significa dizer, por fim, que não de existir violação ao referido princípio quando a conduta administrativa é inteiramente revestida e licitude.

Acertada é a noção de que o princípio da razoabilidade se fundamenta nos princípios da legalidade e da finalidade, não se podendo supor que a correção judicial possa invadir o mérito administrativo. A liberdade do administrador se circunscreve à lei, vale dizer, segundo as possibilidades nela comportadas. Uma providência desarrazoada não pode ser havida como admitida pela lei. O princípio da razoabilidade não incide apenas sobre a função administrativa, mas, ao contrário, alcança qualquer função pública, inclusive a legislativa.

- Princípio da proporcionalidade: seu grande fundamento é o excesso de poder e o fim a que se destina exatamente o de conter atos, decisões e condutas de agentes públicos que ultrapassem os limites adequados, com vistas ao objetivo colimado pela Administração, ou até mesmo pelos Poderes representativos do Estado. Para que a conduta estatal observe o princípio da proporcionalidade, há de revestir-se de tríplice fundamento: 1) adequação, significando que o meio empregado na atuação deve ser compatível com o fim colimado; 2) exigibilidade, porque a conduta deve ter-se por necessária, não havendo outro meio menos gravoso e oneroso para alcançar o fim público, ou seja, o meio escolhido é o que causa o menor prejuízo possível para os indivíduos; 3) proporcionalidade em senti estrito, quando as vantagens a serem conquistadas superam as desvantagens.

Fonte: Manual de Direito Administrativo. José Carvalho dos Santos Filho.

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